Revista do Ensino - v.1, n.5, 15 jan 1912

REVISTA DO ENSINO 283 E' uma intelligéncia clarividente, de lucidez na profundeza, apenas velada á superficie, e que procede por actos de reflexão demorada, jungida á timidez de banalizar-se, e implacavel na crítica de suas próprias obras. Se por um lado, o engendrar lento e consci ente traça o zodíaco em que póde esvoaçar a imagina– ção, por outra parte, impede o transbordamento· da producção á simples impulsiv idade esthética,-e faz que os livros de Graça Aranha se annunci em no céu pratrício, como os cometas, raros e attrahentes. A predilecção de belleza do escritor, nos varia~os gêneros plásticos da arte literária, é o poema .-Parecerá singular esta affirmativa em se trat ando de Graça Aranha, mas tanto Chan aan como Ji1ala 1 arte, r,.a differenciação das formas literárias, per– tencem áquella séri e. Uma qualidade do espírito do autôr, que é mester assigna– lar, de começo, é o seu dilecto pendôr pela meditação, pelo collóquio com as idéas geraes, philosóphicas, que dominam toda a esphera do conhecimento. D'aí o destino ~e sua obra reves– tir-se d'um caráct er universal. Pode-se ainda affirmar que de seu exíguo fabulário d'arte resalta um constante diálogo das idéas. Mala 1 arte é ty po popular , que vive na memória das nossas tradicções éthoicas como uma das figuras moraes de inequívoco entono , e das ma is r epresentativas do nosso génio . Dessa effabulação mythica da imaginari a vulgar , que a alma do povo arrasta num enfeiti çado enlêvo, e que, agitando-se sómente nos domínios da lenda popular, parecia haver perdido a sua physionomi a esthética-o arti sta fez uma criação humana , e viva, e r epresentativa, como o symbolo do destino, da própria vida, levada no rustilhão da fa talidade, que o homem não pode dominar, e explica o seu império inventando a illusão das cau– sas e dos effeitos. Como as energi as vivas da mat éri a, Malazarte circµla em t odo poema: elle é a sombra que entristece á proj ecção da imagem das c0isas; a claridade sorridente que nos desperta para as alegri as ; o sonho abe rto em rosas de scismas num olhar que nada fita, a percuci ênci a duma expressão que trás o sello fa tídi co do aniquilamento . - E' a tyranni a impassível da natureza ante as inquietações moraes de nossa consciência.

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