Revista da Academia Paraense de Letras Agosto 1953

46 REVISTA DA ·ACADEMlA PARAENSE DE LETRAS peh destino, fé-lo cair, fulminado,. nas profundezas do abismo, ai:rebatando à éiê'ncia um dos seus mais formidáveis e diligentes asseclas. Guiado pela mão amiga e sapiente de Osvaldo Cruz, Gaspar Viana en– trara para Manguinhos pouco depois de sua formatura. Ai, nesse laboratório naquela época o mais notável e fecundo no continente americano, Gaspar tres– dobrou a sua atividade, dando largas às suss extraordinárias aptidões de inves– tigador paciente e perspicaz. Em tanta e tão surpreendente maneira pôde agir, que seus trabalhos, quase todos originais, publicados em revistas várias, cedo lhe atralram a atenção de seus coévos, tamanho e tão palpitante o contingente por éles trazido à causa da ciência. Dessas -Ingentes perquJrições, verdadeiros ráios de luz invasores de sombras e penumbras, avultá, como conquista de maior relêvo, o seu método pessoal na c11ra do granuloma venéreo e da leish– maniose, males para cujo tratamento nada se conhecia de realmente eficaz. Tinha Gaspar Viana o mais acendrado amor pelo ensino médico. Estu– dante ainda, lecionava os próprios colegas. Mediante a apresentação de uma tese original, unânimemente aplaudida pela congregação da Faculdade de Me– dicina do Rio de janeiro, conquistou a docência livre na cadeira de Anatomia Patológica, sendo, pouco depois, nomeado professor de História da Escola ..Su– perior da Agricultura e Medicina Veterinária. Apaixonado, até ao delírio, pela missão que a si próprio atribuira, ja– m,üs o viu alguém forrar-se a sacrifício algum no desempenhá-la. Recolhido . em Mangulnhos, remoto do bulicio ,cortesão da grande capital carioca, estu– dava sempre. ·E ali, naquele sossêgo, muito colega o !oi encontrar, febricitante, combalido peb vigília e pelo cansaço, ôlho colado ao microscópio, na mór– bida obsessão do estudo dos seres infinitamente pequenos. E trabalhou, e tra– balhou, com denodo e energia, até exaurir-se e morrer, em pleno florir da juventude, herda'ndo aos pósteros o exemplo de uma vida que se esvaiu no esfôrço executado pua , a conquista cientifica. E não houve quem não dis– se~se : "Gaspar não morreu. Matou-se". Os que lhe privaram a intimidade si,biam-no empenhado na resolução de problemas vários, mas especialmente na descoberta de um sõro anti-tuberculoso, capaz de fazer cair por terra, de uma ve~ por tôdas, êsse flagelo terrível, do qual acabou vítima, que tão assustadora– mente assola o gênero humano, e em cuja extinção há tanto tempo se es- força a ciênch universal. · Senhores. Sôbre tôdas qualidades que exalçam a figura egrégia de Gas– par Viana, uma há que só os seu.s íntimos lograram avaliar : - era o halo de simpátia e mística atração que lhe envolvia a personalidada. Quem quer que dêle se ,iproxlme.sse, para logo haveria de sentir o estranho eflúvio, ainda quando sõbre si visse cair os dardos daquela ironia fina e delicada ,da qual só Gaspar Viana tinha o segredo. Verdadeiro Princlpe Encantador, todos os ben– querlam, apreciando-lhe o mérito singular e a suprema beleza do espírito aáamantino. Fulminou-o, antesazão, a "Jei que não se evita, seu nome, porém, per– man~cerá sempre, redivivo, assim na reminiscência de seus amigos, colegas e patrlclos, como na lembrança agradecida da medicina contemporânea.

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