Revista da Academia Paraense de Letras Agosto 1953

io h :REvis-fA OA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS DE COMO ME IMPROVISEI JORNALISTA Manuel Lobato (Cadeira n. 1 - Artur Viana) Ao tempo em que, com mais desconfiança em minha capaci– dade de que timidez; procurava ensaiar os primeiros passos no cam– po das letras, floresciam os romances de capa e espada, à maneira do Rocambole. E todos os capítulos, que se não cosiam em ordem racio– nal, eram intitulados assim : De como Fulano fez ou Cicrano aconte– ceu. Dai a epigrafe desta velha página ... amarelecida pela ação do tempo. Para lhes falar com franqueza, não lhes poderei precisar a data da ocorrência. Que importa isso, porém ? Ocorre-me, apenas, que andava em prospécto ·a Biblioteca Pú– blica, com grande parte dos seus livros em desalinho pelo chão, pois as estantes eram poucas e tôdas tomadas pelos inquilinos mais afor– tunados. O diretor nomeado, Bertino de Miranda Lima, era intelec– tual de valor, conhecedor da nossa história e da dos outros povos, muito lido e sabido em Cezar Cantu. Apaixonara-se, entretanto, pe– la:; obras a que as decifrações de Champollion e Rawlinson vinham dando origem, com exageros naturais no que tangia às revelações sur– gidas do ventre da terra. Causeur admirável, eu o procurava com assiduidade para con– versarmos sobre assuntos históricos, de sua e minha predileção . Da palestra simples, entendi que deviamos passar a verdadeiras lições. Mas Bertino Miranda arranjou um processo de ensino que muito agradou ao seu discípulo . Dava-me, por exemplo, um volume versando a Caldeia. Eu o lia, sofregamente. E depois, na casa dQ residência de Bert.ino, êle sentado em uma rêde e eu, em outra, trocavamos idéias, discutindo o assunto lido. Andava já em algumas lições a rqatéria percorrida, quando, certo dia, sem o fenômeno · da dôr do Padre Antnnio Vieira mas cer-· tamente, com pruridos de imortalidade, resolvi transmith: ao papel ideias que me andavam pelo cérebro. A forma que lhes dei não sei qual seria - tão longe já vai isso. ' Entretanto, não era de extranhar que pretendessem a imita– ção dos folhetins, que, sob o pseudômino de Mefisto, Bertino escre– via para A Província do Pará, ou das crônicas humoristicas que He– liodoro de Britó, assinando-se Tebas, e Falando às massas, estampava no "Diário de Notícias". Desta ou daquela maneira, muito tímido e desconfiado passei os meus primeiros linguados para as mãos amigas de meu prbfessor. Leu-as êle com muito vagar e, se~ qualquer comentário, pe– diu-me que esperasse por êlc, enquanto 1a preparar-se para sair. Em sua companhia, levou-me- à redação do "Diário de Notícias" onde, em sua ca~teira americana,_de cabeç~ baixa, p_ince-nez de miop~ pendente dum fio de ouro, P aulino de Bhto escrevrn o seu artigo de fuudo . Bertino Miranda, aprox imou-se para o saudar, e, ·entregandQ– lhe as tiras, apontou-me;

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