Revista da Academia Paraense de Letras Agosto 1953

~EV18TA DA ACADEMIA P.ARAENS E OE LETRAS foi estafante e multo trabalhosa, mas alegre e compensativa, ·pois a natureza nos njudava a viver com a exuberante prodigalidade de seus frutos ê de seus cereais, parecendo que uma paz Inefável descia do ceu, como uma benção de Deus, sobre as coisas e sobre os homens. Entretanto, ao começo de minha ve– lhice, vieram os dias calamitosos, as horas amarguradas, e a vida dos povos foi se transformando numa civilização diferente, os caminhos ílcaram mais difíceis de transpôr, os horizontes se estreitaram ao amplo vôo das Iniciativas l!enerosas, e os homens C9meçaram a olhar com desconfiança os seus semelhan– tes, a perseguirem-se mutuamente a retirar vantagem um do outro. As no– bres, as heroicas virtudes do coração humano foram substituídas pelas mais exageradas formas de ganância, da fals!dade, da hiprocrisla, do despudor, da mentira, do cretinismo, parecendo que os homens se requlrltavam nos prazeres da vida mundana, glacialmente esquecidos doR que nasceram para viver supli– ciados pela tortura da dôr. Num rápido golpe de visão sobre todos os recantos da terra brasileira, encontramos uma Impressionante miniatura da paisagem humnnn de todos ns cldndes do universo. A humanidade atravessa um estado de complets decadência moral, e a miséria está a devastar o mundo, em toda a porte a surgir milhares de seres caídos em extrema pobresa, espoliados pelos que gatiram !IS eminencias do poder público e da riqueza desonesto, nn infnme prática dM extorsões oflclnllsadas, a locupletar-se com os haveres da naclona– lida'1e. Senhores, penetrai nas nossas miseras choupanas, Ide aos hospitais, aos Milos e aos manicômios, e lá encontrareis milhares de nossos patrlclos, homens, mulheres e crianças, paludlcos, ulcerados, -:erminóticos, sifilltlcos, tuberculosos, ldíotados. - E onde estão os seus algozes, meu bom velho ? perguntou Antenor . - Aparecem em tôda a vastidão da terra brasileira. otimamente instala- dos em luxuosos ban~alôs, com a barriga replet.a de Iguarias finas e vinhos ca– pltosos, a fazer vla,fens de turismo em aviões "Constellations", a possuir aman– tes cobertas de sêdas e jóias valiosas, arrotando lmpáfia, soberbia e grandeza. - E donde provém. a escandalosa ostentação de tanta riqueza? tornou a p erguntar Antenor. _ De negócios trapaceiros, de roubalheiras administrativas, de multlplas t,ancas de jõ!(o, forçando o povo. a viver a vida de Inferno, verdadeiramente c!ramátlca. Um arrazante vendaval de tragedla está a soprar sobre a naQão hrasllelra. Atu,.lmente, no Brasil, exlstem duas únicas classes: a que m anda e e que obedece. a que vive cm palácio e a que mora em cabana, a que come presunto e !' que mnstlga duro e negro pão da mlserla, a que bebe champanha e a que se embrlaqa com cachaçR. 2 a renovação do antigo senhor de engenho e do escravo a gr ágrlo. E els que surge, vez por outra, os pseudos salvadores da pátria, a Iludir o povo com as suas mentirosas propagações. _ Bom velho, essa é a verdade das verdades, exclamou Antenor. Que beneficio nos trouxe a revolução de 30 ? Melhorou o bem estar da nacionalida– d e ? Equlllhrou a desma11telada situação financeira do pais ? Melhorou, sim, e ·muito, os proventos monetá rios dos de tentores do poder público . Que vemos aquC se não a miserla, pe rseguições, safadezas . Ali está, de olho acê1:o, mãos ropoce~. nariz farejante, o gu,:1rdn do fisco que cal como um urubú sobre a c:irnlça, em cima do Infeliz c11hnclo roceiro, que nos traz o minguado produto de sua pequPna lavoura, e tacha-o de escorchantes Impostos, que se canali• zam, mór parte, à proíundld,de de seus 'bolsos vazios . Apavorado, o caboclo foge. não mais abastece a cidade, e a população que se afumente com a falta f ,.

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