Revista da Academia Paraense de Letras Agosto 1953

1 REVisTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS iOS vento, sonoramente farfalhavam ; poucas pessôas pela rua, e os bondes a passarem quase vasios, - uma feição poética e solitária cheia duma inexplicável nostalgia. Já o douto José Ingenieros nos seus notáveis "Estudos sôbre o amor", cita as nuances dêsse estado dalma experimentado pelos na- morados. · Por isso, Aluísio, no otimismo que lhe povoava o espírito, no– ta~a os ráios de sol coando-se o~las ramarias altas, estampando no chao aquelas manchas amarelas, como um rendilhado fantástico. Só o grande astro, no pino do horizonte, quando já ultrapassou o meio dia, é que produz essa maravilha de polvilhamento de luz n9s trechos citadinos ensombrados ·pelas árvores. E o seu subjeti– vismo descobria todos êsses requintes da natureza, realmente, só aces– síveis aos artistas de raca. Ademais. nas oroximidades, um pianista emérito costumava, a essa hora dedilhar infalivelmente, a partitura célebre de Cláudio Aquiles Debltssy "Clair de lune" casando-se a me- lodia belíssima, com a paisagem ambiente. ' · O romantismo e a arte davam pois, a Aluísio, o encantamento, que é o habitat próprio das ·paixões amorosas, principàlmente quando estas não são correspondidas, que são de fato, as verdadeiras ... A arte emprestava ao amor, alguma cousa do seu idealismo, adoçando como um bálsamo, a sua sensibilidade dolorida ... IDíLIO Dêste modo, os encontros tinham qualquer cousa das adora– ções platônicas a que se refere ' Eca de Queiroz, no seu típico caso ·de "Jose Matias". · . ~ ~le sentia-a passar ao lado naturalmente, ao princfPif.l'. cheia de cunos1dade, por ver um desconhecido com quem todos os dias se encontrava, e que se retraia, fugindo de olhá-la,• como se esquivando àqueles encontros diários. O dia resumia-se de resto, para êle, naqueles rende-vous mudos, em que o acaso. era grande fator. · Mas passavam-se os meses e a mágua não findava. Inhibido pelo orgulho dos grandes tímidos recalcava qual novo Werther, os arrou– bos de um amor impossível'. E os encontros quotidianos, interessan– tes para um, e apaixonado para o outro, porque avivava!Il..um mal sem cura, - foram tomando assim, as aparênciiis de um 1d1ho. Du~a vez ela vinha erri colóquio com um rap~z. • . . Aquilo sobressaltara-o e dera motivo a uma imensa tortura. Quando tal acontecia prometia não encontrá-la nunca mais, e pro– curava se distrair pelos lugares concorridos da' cidade. Mas a sua im•– pressão é que perambulava-·pelo deserto, e o formigueiro humano !lue penetrava, tinha a aparência de uma multidão de bonecos. Por esse tempo acé!b.ara de lêr o insigne escritor francez Octave Mirbeau, no seu· magmflco romance "O Calvário" . Livro belo, pela verdade emo– cional que encerram as suas páginas dolorosas. Comparava-se ao per– sonagem Jean Mintié, na sua desbragada paixão oela f<?rmasa. Julietà Roux, andando como um alucinado pelos recantos mais movimenta– dos de f'.arís. Se se sentisse fraco faria como aquêle : fugiria para longe, evitando se precipitar no abismo. - As v~zes queria se libertar daquêle amor que o sufocava, e é quando mais sentia no ~oração, a pressão das sua~ .'.:!ar:ras. Doutras vezes, dane.ando num balle, em meio de inocente fhrt, ficava, de re– pente, alhe10, susoenso, ausente. Era a sua alma que tinha '(Oado ..para Junto da outra. Certa vez, uma senhora que o observava, disse : :6:ste rapaz parace algumas vezes. que anda com O pensamento dista~te., e te1:1 qua]quer cousa de "pàrado". Era a evocação que o absorvia in– teiro, nao tei;_ido as moças com quem dançava em seus brac:os, mais que um automato. · ' Em c~r~as qcasiüei cabia-U1e ser visto por ela, com outra moça, em Pl oJetos para um "dançarás" prometedor. Mas ab seu co-

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