Revista da Academia Paraense de Letras Agosto 1953
l ió4 REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS lhe um amigo que lhe contou penpec1as porque estava passand~ o Dudú, levando contras de t ôdas as moças, porque por trote, o Mm~o Brasil tinha espalhado que êle mordia as damas quando dançava. Riu então às bandeiras despregadas. Foi nessa ocasião, ainda gosando a partida feita ao camarada, como não tivesse dançado, que resolveu fazê-lo. Ouviam-se os prelú- dios do "Brejeiro", ·maxixe grandemente aplaudido. . Aproximou-se da moça por quem estava encantado e disse : "Pode dançar, senhorita ? ... " Ela, naturalmente, não gostando do ar risonho e ofegante de Aluísio fez com a cabeça um não, num pronunciado gesto de enfado. N.ão d eixava de .ser original a r esposta. Não se dignara nem de falar. Sentiu-se humilhado . Se fôsse uma qualquer, nem tanto, mas justamente a que o fascinara ! . . . Considerava-se ultrajado, tc;,– mando demásiado a sério, um incidente f_ortuito. Não procurou mais os amigos, àquela hora metidos no frevo, deu uma volta, e retirou-se da festa. Tantos sonhos acastelados para gozar o sábado gordo, e um r esultado inteiramente contrário feria-lhe o sentimento e a vaidade .. . A vida tem dêsses desapontamentos. AMOR Foi para casa e passou uma noite pungente enquanto não lhe veio o ·sono. Rememorou a festa ruidosa onde seria inadimissível, que exis– tisse alguém que n ão estivesse alegre, (como fôsse possível se saber o que se passa nos corações) , e logo êle havia de ser a vítima da in- cruenta batalha . . . · Porém, o que acima de tudo o torturava, era a imagem sinis– tra e odiada da mulher encantadora que o havia desdenhado. A ma– drugada, longe, no horizonte, mal emergia da escuridade da noite, sem inundar ainda o céu, com o reflexo dos seus clarões. O perfume com se enx arcara antes de sair, em vez de agra– dável, pungi-o como um cautério, porque se aliava exquisitamente aos fatos da n_oite. · Sentir-lhe a ina lação, era r ecordar a amargura. Mas como era or~ul!'ioso, refletia que haveria <:}e possuir, a dose suficiente de amor propr10, para saber ser estoico, anafar a magua, e esquecer a criatura soberba que a tinha produzido. E adormeceu. OBSESSÃO Por êsse tempo, Aluísio Pena, que trabalhava em uma r eparti– ção do Govêrno, ia para o serviço, seguindo pela Generalíssimo, até a Avenida S ão Jerônimo, todos os dias às 13 horas, depois do almôço. E com surpreza começou de encontrar a moça da festa, que r ecusara dançar, e provocara-lhe tão 'grande sensação. Ela ia sempre acomoanhãda de uma aia, para a sua aula de piano. (Nesse tempo ainda- usava-se de aia). O diabo as tece, disse Aluísio con sigo mesmo, e ficou a pensa r nos acasos do Destino. . Romântico, aquêle trajeto passou a ter para êle aspect o des– conhecidos. Começou a achar aquele trecho urbano, bonito. Com cer teza qu_e a vida tem as suas belezas, dependendo o seu descortino, o~ interpretação, dum estado subjeti".o, favo~ável, ·pen sava. A mocidade, o r omanesco, o amor. enchiam a imaginação de Aluísio dum est ado exaltado em que tudo é poesia. O ambiente o panorama em r edor, o aspecto das ruas, tomam assim, oar a êsses doen tes da ilusão, formas est ranhas de países encantados ,em que tudo é be lesa. . . E assim, êle div isava naquela hora de comêço de tarde, em que a sombr a mudava, e as mangueiras frondosas, ta ngidas pelo
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