Revista da Academia Paraense de Letras 1968

PRESENÇA DA LITERATURA 47 Não podemos esperar que o povo se modifique por si mesmo. Há que trabalhar .de maneira sistemática, há que tomar providências preliminares, sem o que jamais alcançaremos essa etapa ideal em que seja o leitor o principal estímulo do escritor, pelas reações de receptividade, positivas ou não, que se processarem em tõrno de qualquer obra. Trata-se não de criar, como objetivo último, um público ledor que seja a clientela necessária para a dialogação do escritor com ho– mens que o entendem ou desentendem, - mas sim de somar à hu– manidade, tomada concretamente, um processo de abertura para ho– rizontes a serem desvendados como única maneira de ampliar a di– mensão humana do próprio homem. Não estamos propondo a fa. bricação em massa de leitores, mas sim a valorização da linguagem estética como processo de conhecimento, fazenào com que a maioria dos homens se aproxime dos livros como de estradas que conduzem a mundos insuspeitados mas ricos e formosos, em plenitude humana. Há uma notável página de CESARE PAVESE, em sua obra "El Oficio de Poeta", que ilustra admiràvelmente o que acabamos de dizer: el hombre que no vive entre libros y que para abrirlos debe hacer um esfuerzo, tiene un ca– pital de humildad, de desconocida fuerza - la única valedera - que le permite acercarse a las palavras con el respecto y el ansia con que nos acercamos a una persona predilecta. Y esto vale mucho más que la "cultura", al contrario, es la verdadera cultura. Necesidad àe comprender a lo demás, caridad hacia los otros, que es, al fin, el único modo de compren– derse y amarse a sí mismo : aqui se inicia la cultura. Los libros no son los hombres, son medios para llegar a ellos; quien los ama y no ama a los hombres, es un fatuo o un condenado" (5). Diferencia-se, pois, o culto do livro pelo livro dêsse devota– mento ao livro como instrumento de cultura, no mais genuíno sen– tido do têrmo, que é amor e conhecimento dos homens para chegar, então sim, ao amor e conhecimento de si mesmo . Amar os livros e não amar os homens é sinal de loucura ou condenação. Num país como o nosso, em que a maioria nem sequer sabe ler, é tarefa inicial o combate ao analfabetismo - uma das chagas mais terríveis e dramáticas, neste século de progressos alucinantes e cheio de contrastes. Enquanto uma elite de sábios tenta desespera– damente decifrar os sinais enigmáticos que provém, porventura, de

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