Revista da Academia Paraense de Letras 1957

44 REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS em saber que Peregrino Júnior escrevia no meio de tanta desordem e de tanto desconforto. Ao desejar bôa viagem a Martins Napoleão, em crônica publicada em 10 de abril de 1920, Peregrino Júnior escreveu: "E assim eu, a mi– nha banca a êste quarto - sem esquecer o Waldemar, que é um ino– fensivo inimigo dos poetas e sonhadores - vamos entrar para a histó– ria da literatura paraense e talvez - quem sabe? - ainda figuremos num suculento capítulo da "Antologia" do Jacques ... E realmente. modéstia à parte, o Waldemar, a minha banca, o meu quarto e eu mesmo - temos o direito a essa homenagem da posteridade, sem favor". !E sem favor mesmo, Peregrino Júnior não entrou somente para a .história da literatura paraense, mas para a histórià da literatura nacional. A profecia, feita talvez por ironia, humorismo ou frivoli– dade, realizou-se, de maneira mais ampla, mais bonita, mais merecida. · Martins Napoleão, Osvaldo Orico e Peregrino Júnior formavam, em 1919 e 1920,· uma trindade inseparável. Liam, escreviam, sofriam j,úhtos, ."repartindo um com os outros, com um carinho de irmãos, as emoções, as idéias, as tristezas, que ficavam assim diminuidas e as alegrias, que, assim, ficavam maiores ... " · Confessa Peregrino· que tudo os aproximava, estranhamente: o ideal, o desconforto, a confiança nêles mesmos, a desconfiança dos outros, a vontade de vencer, as dúvidas e as esperanças, e o amor. · Certo dia, Antonio Bona - "êsse boníssimo e generoso amigo,. que tem bondade até no nome" - o foi b-usca·r da boêmia no "Jar– dim da Melancolia". E é o autor de "Pussanga" quem escreveu, em 1920: "E o nosso sonho? - Era o mesmo . . . Irmos os três para o Rio de Janeiro, vencer de mãos dadas, fraternalmente" . o primeiro que se foi, para dar início à concretização do sonho, que se realizou, depois, triunfalmente, foi Martins Nnpoleão, a bordo do "João Alfredo". o segundo foi Peregrino Júnior, que à véspera de sua partida, a 7 de maio de 1920, foi homenageado com um banquete, no "Grande Hotel", por seus amigos e admiradores. Peregrino Júnior conheceu eventualmente Osvaldo Orico numa das salas de aula do Ginásio "Pais de Carvalho" . Outra vez Osvaldo Orico foi encontrar Peregrino ensaiando passos coreográficos' de salão num clube de segunda ordem, onde lhe dera entrada a sua caderneta de repórter e ao atual ocupante da cátedra de Ruy Barbosa na Casa de Machado de Assis, um convite cartonado com que a gentileza do redator agraciara o seu trabalho estafante de suplente. Osvaldo Orico, à . mane~ra ~o nosso ~uerido e fluente Rodrigues Pinagé, impunha-se a adm1raçao e co~s1deração dos convivas, reci– tando trechos dos poetas que lia entao. Peregrino, escreve Orico, olhava atento, esperando que findasse a truculenta ênfase declama– tória para volti:r de novo à ".ertigem_~o movimento dançarino, go– zando a ingenmdade de um tipo femmll que lhe bebia as primeiras declarações de amor. Por paradoxal que pa reça, dois dias depois, estavam os dois frente a frente em um enterro qualquer, e sem dar que deviam guardar silêncio, escreveu Osvaldo Orico em 1920, em crônica de despedida a Peregrino Júnior, foram "a pouco e pouco trocando idéias a respeito. o 0 '

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