Revista da Academia Paraense de Letras 1955

ltEVlS'l'A OA ACADEM IA PARAENSE DE T.E!TRAS 11 llecot•do-me que, em vez de casinha, eu escrevera casota. Frederico '.Rhos• Nard sugeriu casola, ou casinhoto, por menos desgastados. Era num dia de Uor, ga do poe ta. PP.ullno de Brito, induzido a opina r, foi quem decidiu: casinha di– minutivo C!'.rinhoso, fswo de mel, é que ficava bem. E casinha venceu os co~cor– rentes. Foi injustlç;i clamoros!\ que a Pos terld11de, dama de juízos lnsubstanciais, cerrasse os batentes às minhas redondilhas, com sabor silvestre, e os escanca– rasse às de Camões 1••• Eram meus professores de Poétlc11 João de Deus do Rêgo e Eustáquio de Azevedo . Aquele recebi!\ um cruzado por lição . MinhR 2v6, que lhos entregava pontualmente, revel11r!\-se vezeira em enxert?.r, nos 9ag?.mentos. os patacôes xen• xens com que impiedosamente a ludibriavam certas freguesas de renda . Abusa– vem d2 cegueira parcial da saudosa velhlnh:i, a quem um insulto cerebral arre– batara a visão do Olho esquerdo e deixa ra opaca a do direito . J oão do Rêgo não reclamava. Era mulato polido . Impingia-os, por sua vez, :>,'J t!lberneiro da esquina, português do Algarve, setuagenário, corcund11. e de geb!I ambient,.da no Brasil há 60 anos. Dec11ia-lhe o rosto para um lado, n ão me lembro se par~ a direita, como o de Rui Barbosa, ou se par,i a esquerda, como o do engenheiro Antônio Acatau,1ssú Nunes. Tinh11 acen tuado fat acaz p ara as letras. Fazi!\ versos coxos e 1111, com sofreguidão, rom~nces de mora l equivoca . A mesma Inclinação do personP.gem de Sh?kespcare. Gu,-rdava a receita do bal– cão entre p.s !)á&i:1as dos livros, para despistar os g!'.tunos, se lhe e ntrassem em casa. João de Deus tornou-se u:n dos mais !\ssiduos leitores d" biblioteca do ve– lho Alfredo . Tod11s as semanas, tomava, por empréstimo, um deles, e lhos res– tltula desfalcados de uma p a rte do conteúdo pecuniário. As Uçôes consistiam em f11zer-me copiar, a Japis. em cursivo ordinário, a "Dama d11s Camélias", recomend!'ndo-me aue s2-Uen tP.sse em normando os nomes do protagonista e dos antagonistas. A escolha do livro tinhl\ por fim a beberar a minha alma na fonte d~ paixão amorosa, que o poeta cons iderava a f ôrça gera triz da verdadeira poesia. Explicava: -- Era n,ais conforme aos cânones clássicos ministrar-lhe os ensinan1en– tos genialmente condensados na "Epistola aos Pisôes", que a latinidade nos legou , mas lá " coisa é em pés e agora quem dá as c:\rtas e joga de m ão é a s ilaba . O romantismo soterrou o classicismo. Eustáquio não aceit11va dinheiro. Vi-o uni:, vez, pc uado 9or c redor impla– cável, pior que cão venatório. a quem devia, há dois :,nos. seis mil réis, atirar no solo, com desprezo. uma cédula de dez tostões, escarrar nela um esputo gros– so de ressaca, e bre,dar , de faces congestas: - - Eis aqui, senhor, uma p!\rcela r P.zoável da som:, que lhe estou deven– do ! Leve-!\ 1 F-"ÇB-"· desa p~reccr dos meus olhos I Esse vil metal é a causa de que tudo neste mundo ande corrompido e pela hora da morte. O credor esboçou um ar de ch11sco e de re9u gnància, p.:>.rlindo sem apa– nhar do chão O dinheiro. O poeta, logo que o viu a distân cia, recolheu, com so– freguidão, a cédula m i>ltratada, libe rtou-a da s?llva e. devolvendo-a ao bolso do colete, carinhosamente dobrada. gritou ao credor: -- Então não quer mesmo ? Se c u fôssc g11l0 de rlnha:lciro aceitaria a luta . Traga-me um milhão delas, cuspid~s. encnta rr?das, sanguinolentas, como lhe aprouver. e eu lhe mostrarei que não sou homem de 9ituit11s ! Vá a gora de – sacreditar-me, espalh?ndo, no comêrcio. que te nho o h ábito do CP.lote ! Devo, não nego, m~s nunca m e fe,Itou vont:\dc de p?gar. Tomo a Deus por t estemu– nha! O dinheiro, sim, é que me falia . E voltando-se pr\r:l aqueles a quem o espanto reunir a à s ua volta, decla- rou, com sole nidade· _,_ A recusa d~ssc porl1.11?1•'·~ ê pu1·n implica~ão cun1igo, porque sou b~a• t:!loilo 1

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