Revista da Academia Paraense de Letras 1954

REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE Dl<~ LE'l 'P.AS óperas, concertistas, tudo são dos meus conhecimentos. E como me acos– tumei a ver, a sentir, a compreender o teatro e dêle me fiz cronista, posso falar alto sôbre Renato Viana. cta sua personalidade de ator e autor, fazendo . comparativos irrecusáveis. pois sou um velho teatrista que tanto se emocionou com as encenações e interpretações de Noveli, Emmanuel, Zaconi, de um Dias Braga, de um Ferreira de Sousa, o artista luso-brasileiro que superou todos os intérpretes do " João José", na opinião de Noveli; de um Brazão, <le um Brandão, de um Chaby, de um Cristiano, de um Luiz Pinto. de um Henrique Alves, de uma An– gela Pinto, uma Rejane, uma ·Duse, Nllla Sanzi, Lucinda Simões, Itália Fausta, Lucília Peres, enfim, um mundo de notabilidade, em um mundo de peças de eleição, dé fazer rir e de fazer chorar, de comover, de emo– cionar e de encher-nos de saudades que nunca se apagam. Quem não viu e aplaudiu tôda essa gente, todo êsse teatro, não faz bem idéia 1los talentos, da caoacidade, da idoneidade artística de Re– nato. Não pode avaliar do que foi seu poder de autor e ator, essa dupla feicão da sua personalidade de intelertual. de estudioso. de supervisio– nador do Palco. E não sendo assim oih ado ninguém poderia, com segu– rança, ter visto Renato Viana. artista, dentro da sua volúpia, do seu epi– curismo de verdadeiro paladinho do teatro, faculdades que lhe deram amplos direitos a uma vaidade justa e humana, que êle entretanto des– ~rezava, recolhido à sua modéstia, essa :nodéstia a que os talentos autên– ticos, os valores que se impõem naturnlmente. costumam abrigar-se, como um debiaue à gana fobica da inveja maldizente dos aniquilados. . Quand<? êle aqui estev~ pela última vez, em 1947, em certa opor– tumdade, assim lhe falamos, de corpo presente : "Vão-se dez anos que pretendíamos dizer-te algo, Renato. saldando, contigo, a velha dívida, que em silêncio contraíramos conosc0 mesmo. E acrescentei : Renato, você agora veio de novo até nós, servindo, persistente, aos mesmos pos– tulados da sua mocidade. A vida.de Belém, - cáos de tristeza, - nestes ú_ltimos dias tomou outra feição, um outro aspecto, entreabrindo o sor– nso de sua melancolia. como para fe:;teiar uma hora de intensas emo– ções, um instante de dôces eflúvios. como aqueles de outrora, de tempos Que partiram com adeu ses inesquecív1::is, de que nos resta à lembrança e as histórias que contamos, em palav ras fugazes, às gerações que repon– tam. e de cu.ia saudade. que se vai esbatendo na penumbra dos anos. você Renato, é o portador. neste minute, d emorado de desalento, de uma sociedade Que viveu na luz ; nesse minuto cruel de friezas e pessimis– mos, dos que se acovardam a nte o trabalho. incapazes ante o heroísmo da produtividade, da persistência e da inteligência. , Senhor Presidente! Nas prelimmares acima estão desvendados o · assunto e as razões que aqui me trazem. Para evitar cair no tabaquismo comum, sediço, antipático mesmo. dos votos de pesar inexpressivos e Quase sempre vasios de sinceridade, não iniciei-êstes acêrtos procla– mando falecimentos e entêrros. Nestas alturas desejo oficializar, nesta Academia a ausência para a vida eterna do nosso velho confrade Re– nato Viana, que aqui dentro dêstes rr.uros imortais confabulou intima- . mente conosco durante momentos inesq•Jecíveis, em meio à recepção fra– te rnal, de irmãos intelectuais, que a êie: oferecemos como artista ligado ao nosso meio, de menino à juventude. nunca se esquecendo do Pará, pela vida afora. · · Renato n ão era um Imortal da Academia, mas foi° um Imortal da Arte Acadêmica, na palavra escrita. na oalavra falada, na integração de almas humanas, na tradução de vidag alhe ias, por êle encarnadas com a compreensão precisa de um psicólogo. a oenetracão de um vidente, comunicando todo êsse poder da sens;"oilidade às platé ias em extases, presas de emoção, na escuta do seu ve,bo, dominante de expressão inter– preta tiva, e abraza:das no calor da ac[io das personagens que êle sabia criar e lhes dar a vida precisa oara a ::-ua agitação do procênio. ' Estou certo, senhor Presidente, que êste cenáculo, cheio de homens n:ientalizados, de criaturas de sentimentos suaves, de melindres de sen– sitiva ; estou convicto que esta Casa r eceberá com mágua e pesar como– vidos o éco triste do passarJ?-ento de R~nato Viana. Que no$ importa a

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