Revista da Academia Paraense de Letras 1954

REVlSTA DA ACADEMIA P.'\H i'.E?;s;: nt-: LETRAS 5 - Aqui está o que eu fui fazer ! Aqui está o que eu fui fazer ! Mete pe na a s ua aflição. Abemola a voz e de olhos embacia– dos, t odo doçura e humildade: - Minha comadrinha, me perdôe pelas cinco chagas de N. S. Jesus Cristo! Tenha em conta a minha bôa intenção. Amelinha está cheia de corda. como um "réveille-matin". Desan– d a; sem embargo da submissão pe nitencial' cio compadre: - O senho r só tem olhos para mim. Anda t ão cego que não vê a verdade onde ela é tão clai·a. P ois fique sab e ndo que e u tenho s ido o anjo da guarda de seu compadre. Ai dêle se eu não me importasse com o seu modo de vida! Onde estaria? No cemitério ! E o senhor te ria concorrido para isso com a sua parcialidade. - Minha comadrinha, pelo amôr de Deus ! - Só eu sei o que sofro, compadre. Ninguém inveje a m inha sor- te. Eu preferia andai· pelo canto dos outros, trabalhando como escra- va, a viver no meio deste conforto, que amai·ga que nem fel. · E indicando, com o queixo sobreer gu ido, o marido, enrodilhado no seu silêncio : - O senhor está vendo êsse homem? O ar é de quem não mata uma môsca, não é assim ? Mas não queira saber de que é capaz quando vê um cabo de vassoura vestido de saia. Tudo lhe serve: branca, preta, mulata, cafusa, cabocla. E ' doido pelas mocinhas, que andam se oferecen do como artigos de contrabando pel as casas de fam ilia, a trôco d e um vestido, dum sapato, dum v idro de cheiro vaga~undo . .. Elas não querem saber se o homem ê solteiro, casado ou viuvo. O que e las querem é que lhes d êem as coisas. Pre – fere!:1 até os casados, porque são discretos, pouco se importando se tem cabelos brancos ou pre tos. O sr. Joaquim conserva-se de olhos no chão, não tuge, não esboça um gesto. Percebe-se que está apavorado. Amelinha continua a desdobra r-se na sua incontinência de con · ·ceitos: . - O senhor , compadre, ignora o que são essas moças de hoje. Só falt~ se m e terem por baixo dos pés dos homens. Enga nam os pobre~ maridos como cozinheira velhaca engana p atrôa. O que elas querem e luxo e quando encontram um bestalhão como o senhor meu mando, tiram-lhe at~ a camisa do corpo. ' . Paulo ouve tudo com paciência, desatendendo a todas as d e txas que a esposa lhe a tira como luvas de desafio. Ela prossegue na sua loquacidade, ressoante como cristal percutido : - Que Paulo se metesse com mul heres livres, aqui está quem fechari a os olh os. Mas o fraco d ele são as d on zelas sassari•queiras. E' um namorador a todo o transe. E é disso que e u te nho mêdo. S e peg_ai·em um bimba dêsses não o largarão m a is. E depois - pront_o _: Esta P a ulo com uma familia postiça ao lado d a verdadeira e quem_ vira a sofrer sou eu, são os fi lh os se êle não f ô r até parar na cadeia ou não leva r um tiro que o liquide. Não acha o compadre que eu tenha razão? O sr. J oaquim fi nge que não ouve. Gato escaldado não quer con– t acto com a agua fria. Amelinha cohonest3 por essa f ó rma os seu s ctúmes. E justifi– ca-se: - O senhor quer vêr até onde essas deslambidas levam a a udacia? Eu lhe conto. Uma noite destas fomos a o "P opular" . Olhe que pod l– amos ter ido a outro cinema mais perto de casa, mas e le se l embrou do "Popular·•. Vi logo que isso trazia agua no bico. E não me enganei. Sentamo-nos num dos bancos da frente. E' para onde e le costuma me

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