Revista da Academia Paraense de Letras 1954

REVISTA T),\ -~CADEMll\ PAH.\ENS~ DE LE'l'HAS l ?' "Fez-se um grande silencio ha Sala do Juizo Final e o homem E Deus abriu o Livro da Vida: E disse ao homem: "Tua vida foi má; tu te mostraste cruel para 0s que precisaram de ti' e os teus ouvidos permaneceram fechados aos gritos dos meus aflitos!"· E o homem, respondendo, disse : "Assim o fiz". E outra vez Deus abriu o Livro da Vida. E disse ao homem: "Tua vida foi má. Procuraste a beleza, que cu mostrei e desprezaste a bondade, que eu escondi! Nos muros do teu quarto havia imagens pintadas, e tu te erguias de teu leito de ignomínia ao som de flautas ! Exibiste ao sol tua loucura e ao luar tua lascívia". O homem, respondendo, disse: "Assim o fiz! " E, pela terceira vez, Deus abriu o Livro da Vida. E disse ao homem: "Má foi a tua vida. Com o mal respondeste ao bem. Quem te procurou, em busca de água, afastou-se sedento e a quem te trouxe amôr, deste, em troca, ódio,' e, quando muito, prazer". · O homem, respondendo, disse: "Assim o fiz!·" E Deus fechou o livro da vida. E disse ao homem: "E' fóra de dúvida que tu irás para o in– ferno! E' para o inferno que te mandarei. "Mas o homem retrucou: "Não o pod~s fazer !" E Deus perguntou ao he>mem: "Por que não te posso mandar p:ira o inferno? Qual o motivo? "Porque no inferno eu sempre vivi", respondeu o homem ;E: fez-se um grande silencio na Sala do Juízo Final. Mas, novamente Deus falou, e disse ao Homem: "Se eu não te posso mandar para o inferno, irás en tão para o Céu! E' para o céu que te mandarei!" Mas o Homem retrucou: "Não o podes fazer! "E Deu:; disse ao Homem: Por que não te posso mandar para o céu? Qual o motivo?" - "Por que nunca fui capaz de o imaginar, respondeu o Homem. · E fez-se um grande silencio na Sala do Juízo Final. .." Lembra aquela resposta de Laplace a Napoleão quando este lhe perguntou porque não acreditava em Deus. ".Porque para as minhas conclusões cosmogonicas, não tive necessidade dessa hipotese". O silencio m;iis famoso, porém, é o de Jesus deante de Pilatos. (Evan gelho segundo S. J oão, cap. 18, vers. 38). Eça de Queiroz é quem descreve bem a cena em seu romance "A Relíquia" : "Eu vim ao ·mundo para testemunhar a verdade! Pilatos considerou a Jesus, um momento, pensat;vo, depois, encolhendo os ombros : "Mas, homem, que é a verda– de?''.- Jesus de Nazaré emudeceu, - e no Pretório espalhou-se um si– lencio, _como se todos os corações tivessem parado, cheios subitamen– te ?e mcerteza". Se eu não fosse exigir, como iria exigir, que me queimem a carcassa depois de eu morto, pediria que escrevessem sobre o meu t .'.imulo: '·F'ez-&e, sobre quem aqui jaz, o perpetuo silencio! " Outra palavra também belamente usadà em, nosso Codigo Civil é, sem duvida, a pa lav ra Leito. A imagem Leito foi fartamente e111- pregada na literatura. As expressões : Leito de Dôr, Le ito de Morte. Leítll Nupcial transformaram-se até em dcsmoralizadíssimos lugares co– muns de tão lnrgamcnte utilizados. O nosso Cúdigo Civil, em seu art. 263, lNC!SO IV, fala e:n "filhos de outro leito", e em seu art. 248, inciso 1° . em ".t:ilhos de le:to anterior". Trata-se da imagem já batida leito empregada de mudo origi nal, copaz de sat ·srazcr ao le'.lor de m ais exige11te bom g ~sto. Machado de Assis no seu formoso soneto c::imoncano à esposa mol'ta, remoça, de maneira genial, a velha imagem Leito de Moite

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