Revista da Academia Paraense de Letras 1954

\ Í H REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS Um Quarto de Século de criação literária d.e Ferreira de Castro O notável romancista lusitano Ferreira êle Castro completou, em 1953, um quarto de 'século de criação literária, o que significa dizer que durante 25 anos consecutivos o admiravel autor de "A Selva" vem enriquecendo as letras universais com o brilho de seu talento. A "Revista da Academia Paraense de Letras" homenageando o gcande romancista de "A Lã e a Neve", que já atingiu a sua quarta edição, transcreve do Suplemento Literário do "O Correio do Porto" de 12 de maio de 1953 o seguinte artigo do escritor Alvaro Salema : Quando escrevo esta breve nota ainda a dis tância da sua presu– m ível publicação, Ferreira de Castro é dado por livr e de perigo das consequências de uma operação que chega ram a fazer recear pela sua vida. Nas horas de a nguúst ia que passaram, p udemos todos - os seu s - mais• íntimos, e os amigos e companheir os de jornada, n a existência afectiva e nas actividades literár ias - sentir ma is profundamente o ter– rível vazio q ue à nossa volta deixaria a sua premat ura part ida;e ser á com r edobrada emoção que em breve, ao ser -lhe p restada a ho– m enagem pelos seus vinte_ e c inco anos de tr abalho de escritor, de– marcados pela publicação do romance "Emigrantes", estaremos com êle n a a legria de o ver r essurgido para a vida e para a ação criador a de q ue tanto esp eramos ainda. Os seus livros n ão são apenas uma ex pressão do mundo em que vivemos, entre inquietações e esperanças : são também uma for ça da existência a construir - da existência que desejamos mais generosa, mais h umana· e mais humanamente criadora. A publicação de "Emigrantes", em 1928, fixou data na história li– terária portuguêsa, que é também um ponto de partida decisivo. Na poesia estava ainda em plena gestação o movimen to renovador de que a ger ação dê "Orfeu" lançara as primefras fórmulas e métodos e vi– nham lá. de fóra inspirações que teriam longo sulco a traçar nos r u– mos novos da expressão lírica. Na arte da ficção em prosa por ém os caminhos do passado já pouco ou nada poderiam desdob;ar-se para rumos originais e, sobretudo, para a expr essão profunda das realidades human as contempor âneas na su a feição positiva e estimulador a como em todas as épocas foi condição de vitalidade e autenticidade d~ tôdas as litera turas. Vindo do jornalismo e de tentativas literárias em q ue fez a son– dagem inquieta de sí mesmo e dos caminhos a tomar Ferreira de Castro desvendou com "Emigrantes" e logo a seguir co~n "A Selva" um novo rote iro para a criação literária no r omance na novela e no conto - e um novo r oteiro que era ao mesmo tempo' uma nova alma. Eram as r eal idades v ivas d o povo, com as suas dôres obscuras com as suas anciedades muito enr aizadas no q ue é primário e v ital na existência, com o seu in deciso sentimento da humilhação e da mi– sér ia, com as s uas espe ranças aventurosas e errá ticas, que v inha à su– perficie d a nossa literatura de g rande f'x pansão. Não o povo como t ema folclórico, imagem colorida e ornamental de u ma r ealidade pai– sagística, m a téria dócil e pitoresca para talentos lite uár ios ricos mas sem emoção p~of~nda :-- ª!1t~s a humanidade di_recta e_ sentida em que pulsam as angust ias m!lenanás e quantas vezes mconsc1entes do desam– paru e da injustiça. ..

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