Revista da Academia Paraense de Letras 1954

9ó RÉVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS Essas injustiças não diminuiàm, porém, no ·espírito de Jorge de Lima o desejo de entrar para a instituição. Não deixa de ser curioso considerar êsse sentimento de aspiração acadêmica num poeta do va– lor imenso de Jorge de Lima. Imaginamos, em geral, que o desejo da Academia seja um atributo dos espíritos menores, das almas gregárias, que tenham necessidade do amparo uma das outras...· Um Goethe, um Victor Hugo, um Tolstoi devem ter, no secreto, o despreso das vaidades acadêmicas ... Porque, pois, um espírito genial como era o do nosso poeta haveria de preocupar-se tanto com uma glória tão mesquinha, t5o frágil, tão desdenhável, como é a glória de uma investidura aca– dêmica? Bernanos, que era um espírito sem hipocrisias e sem subterfú– gios, muito bem o serit iu; e melhormente o exprimiu, em certa carta que já agora adquiriu celebridade nos meios acadêmicos. - Pedia Jorge de Lima a intervenção de Bernanos junto a Miguel Osório de A lmeida, a fim de que êste viesse a dar-lhe o voto na imortalidade. Respondia-lhe o elk ritor que sim, que fizera o pedido. Mas acrescen– tava : " ... pour ma part, je prie Die u de permettre au Diable de brouiller l'election afim ·que vous n'entriez dans une societé' incompa– tible avec votre inteligence et votre pureté". Bernanos fazia ver, logo em seguida, que êsse seu ponto de vista não era relativo apenas à Aca– demia Brasileira de Letras ; por ém se estendia a todas as Academias, fôssem quais fôssem. E eis como fulminava toda1; as instituições dessa ordem: "Um esprit de fourberie contaminante pervertit les personnes les plus indemnes que entrent dans ces societés plus ridicules que la maçonnerie, parce que elles sont sottes et inefficaces. Sous ]'uniforme academique grandit la n,oississure de la mondanité pourie et tous ces petits tartuffes vivent de la louange ofiicielle et- d'une politique lite- · rairequi souJeve le couer". E concluía asim a sua carta: "Je vous re– proche, mon cher ami, m'amoir demandé une chose pareille et princi– palment de la disputer .Que Dieu me garde vous detester, mon cher Jorge, et me concede la bonheur de ne vous voir jamais dans un pareil millieu" . Sa bemos q ue Deus concedeu a Bernanos a felicidade que êle pedia - a de não ver o· amigo consagrado na imortalidade. E sabemos tambem o quanto feriu o coração de alguns acadêmicos brasileiros mais sensíveis a djvulgação dad:! por Jorge de L ima às opiniões do escritor francês - divuJga.ção essa f ~ita ainda éste a.no de 1953, quando Jorge editou, fora do comércio, uma seleção das melhores cartas de Bernanos. Mas a dureza do julgamento do escritor francês acerca das Acá– demias em nada influiu no espír ito de Jorge Lima : e êle continuou, como sempre, a acalentar o sonho de ser acadêmico. Pobre e iludido poeta ! Não saberia êle, com efeito, q ue a glória de ter escrito um só dos seus belos poemas - '·Essa Negra Fulô", "Inverno", a "Invocação a Israel", certo soneto camoneano dedicado à obsessiva Lia, um outro soneto maravilhoso em que éle confunde a imagem de sua ama de l eite com a imagem da vaca leiteira - vale mais, muito mais do q ue todo o esplendor de qualquer uniforme acadêmico ? . . Tristes com as decepções frequentes de que na Academia viam ser vítima o poeta. alguns acadêmicos, amigos dêle, resolveram, há al– gum tempo, indicar o seu nome para a prime ira vaga que ocorresse na instituição. Esse grupo (peço licença aos meus caros col egas para co– meter a pequena inscrição) compunha-se, de acôrdo com o que pre– ceitua o Regimento eram os seguin tes : Alceu Amaroso Lima, Aldemar Tavares, Aníbal Freire, Barbosa Lima Sobrinho, Cassiano Ri– cardo, Manuel Bandeira, Menotti del Picchia, Mucio Leão, Olegario Mat,ano e Viriato Corrêia. Jorge de Lima, chegou a ser informado do

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