Revista da Academia Paraense de Letras 1953 (MARÇO V4 EX 5)

02 :tu!VIS'i'A DA AÔADÉMiA PA:RAENSE DE 'LE11RAS que não parece menos provável, desejoso de exibir-se em teatro mais vas to obteve a sua aposentadoria - uma aposentadoria mag:rissima 1 - e veio par~ Belém. Felizmehtê; -"sãêú'di'élê:! o jugd· do'· pohto diário na rep artição, o ' poetJ ficava livre como as aves do céu, habilitado portanto a dar largas a tôdas as suas fantaslil3 : huncll se•·énsara, po3to que o seu coração não fôsse insensivel aos atrevimentos do amor, como se verifica pelas confissões que deixou contidas em muitos versos . Consta, mesmo, chegara a apaixonar-se seriamente mas sem ventura, por uma "yaya", por êle comparada llndáinêhte a "uma gazela comendo cajá". Havia nesse tempo em Belém, na parte hoje invailida pela Pari bf, tim estabelecimento sui generis, que o povo éhamava ·'a casa dos bichos". Um grande sortimento de araras, papagaios, piriquitos, macacos, aves canoras e outros representantes da nossa rica fauna, mantinha-se ali ein cõhstnnte expo– sição, à espera do forasteiro amante dessas aquisições. O poeta Ricardo alcan– çou, não se sabe se a titulo oneroso ou gratuito, um arremedo de mirante Je acanhadissimas dimensões, que ficava sôbre a porta principal ; foi ali que se aboletou ; e era ali no melo do alarido da bicnaria que êle poetava. Desde essa época as suas produções passaram a ser datadas do "Gabinete florido e literário do Vate cantor das plagas paraenses e amazonenses". o jornalismo político perceoeu em breve o partido que poderia tirar daquela personalidade, não para fazer política, certamente, mas para manipular descompostucas em versos contra os adversários. O "Diário do Gram-l:'ará" tomou-o a seu soldo, abriu uma sessão intitulada, "Sarilhada", e ali pontificou 0 poeta }{\cardo, ponao os que lhe eram ina1caaos na rua da amargura. .1-1.s sátiras não eram dignas de Tolentino, como o leitor fàcilrilente presume, mas 0 certo é que atraíram sôbre a v1t1ma o red1culo, apepinavam a desésperar. Por 1sso todos as temiam, e o poeta, estimulado pelo sucesso, com a rapiaez de u rn molinete dava à estampa "sarilhadas" sobre "sarilhadas", agredin'do a meio mundo com a fúria e a petulancia proprias dos lrresponsaveis. viga-se cm abono da brandura de costume; daqueles tehlpos, jamai,r encontrou, apesar de tudo qoem O chamasse ao sentimento da realidade e das conveniências, com umas lambadas, ou uma boa carga de p á u. certa: noite, por Ins tigação de individuas perversos, atreveu-se a ir à Sé com o fim' de cantar --o Pirolito" diante de D. Antônio cfe Macedo Costa, qundo, diante de um auditório imenso e enlevado, o grande Bispo estivesse a ,pregar. Dessa vez ao menos a protervia lhe sairia canssima, se a sua boa estrela não o fizesse mudar de re3olução. Uuviu o sermão até ao fim, com– pletamente dominado, e retirou-se murcho e cabisbaLxo, murmurando : "Com t:ste velho não me atrevo a brincar" !. Depois que as ..sarilhadas" começaram a cair na· indiferença, por lerem aparecido outros Ricardos, apocrifos em outros jornais, t omando a desforra contra a gente do "Gram-Pará", o Ricardo autêntico passou a fazer dinhefro vendendo as suas composições, pos tas em música para dmto com· acompa– nhaméntó JI piano. Diá riamente era visto pelas ruas da cidadé com um rõio debaixo do braço, impingindo a quem podia, ordináriamente por surpresa; as suas obras primas. Mais tarde organizou-se ao ponto de cantá-las no pâvilhão de Flora ela festa de Nazaré, trajado à corte : casaca•, cal\;as at-é os jtlelhos, meias d~ ~eda sapatos rasos com fivelas de prata : na cabéça um laurél de poeta, como êsse~ que vemos nos retratos de Camões, nas mãos um panoeiro, ornado de r·tas com que se fazia acompanhar. 1 Jl>eu para papa __._ jantares. Onde farejava ~fü'an_ça, lá sê apres-entava com 0 seu pandeiro, recitando, cantando, dansando, d1vertmdo a amável· companhia, · mo verdadeiro histrião, em troca do que lhe da vam à comér e· beber. co Foi reduzido a esta triste situação, bem indigna de um predileto 'das musas, ·que, 0 pobre Ricardo desapareceu. Onde ? Como ? em que dia ? Confesso, le.tto-r rteste ponto a minha Ignorância : nãd sei 1 •

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