Revista da Academia Paraense de Letras 1953 (MARÇO V4 EX 5)
ftEVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS AS DIFAMAÇõES E GIJóRIAS DE D. JOÃO VI \VENCESLAU COSTA 53 Rcfulgia a alvorada festiva da ·mocidade do príncipe da Casa de Bra– gança, que mais tarde fôra o rei D . João VI, quando naquele ano de 1785, com as pupilos abertos a o mágico deslumbramento de horizontes coloridos, o jovem, lusitano uniu-s e à prJncesn c ; rlota Joaquina , em núpcias celebradas entre os gargantelos do sinos e 11 nlegria dos duns cõrtes peninsulares. A rutilância da p ompa eclesiástico, quem se consorciava com aquela moço dos Bourbons de Espanha, nnscera com a d ifícil missão de reinar sõbre um povo que havia séculos se tornara poderoso pelas suas conquistas e doml– nio dos mares. E aquela união de principes - í!lc ao viçor dos 18 anos e ela quase atingindo a undécima primavera, - por um golpe satânico do destino,. tinha ns características de um cons órcio fa tldlco. Eram duas figuras plasmadas por um fenômeno assombroso, de moldes esquisitos, que a fatalidade as unia pela crueldade dos seus caprichos enigmáticos. Na pequena estrutura daquele físico feminino n ão se desenhavam as mais pálidas nuances de beleza, assim como o príncipe, filho de wn indolente da dinastia com uma sobrinha que a razã o ardera no incêndio de wna demência, simbolizava wn truão, revelando s intomas lamen~ávels de nulidade, em cujo. crãneo, segundo a lição dos historiadores, também volureavam Influências fortes de uma loucura hereditá ria. Se êle debcava-se domina r pela volutuosldade de uma Insaciável gastro– nomia, a princesa, irrequieta, trazia o signo nefasto das maldades. No borborlnho inaudito da politica da Lusitânia, quando tudo efervescia, a ampulheta marcava-lhe as hor as enternecidas pelas baladas embrlagadoras de uma vida despreocupada. Mas aquele clima de tra nquilidade, a um sôpro mais rijo da ventania, sofreu efeitos violentos de transformação, com a morte do Irmão mais velho, o legitimo herdeiro da corôa. E, assim, a aragem carlclosa que modulava hinos de bonança aos seus ouvidos, se encheu da raiva das pan– teras e , de súbito, alte rou-lhe a lentidão dos dias. Tudo, aos seus olhos, tinha o aspécto de um ciclone . Sentiu trepidar o chão sob os seus pés e arqueou-se ao pêso das responsabilidades de enobrecer o cetro que um dia as suas mãos teriam de sustentar. A regência vêm-lhe numa hora de convulsões, que abrem fundos sulcos de terror na vida portuguesa. No ambiente do paço, impetuosas rajadas de decadência balançavam o edlClclo da monarquia. A política dos palses do velho continente tinha a efer– vescê ncia das lavas dos vulcões. E enquanto a Espanha, num coleio ardiloso, firmava os seus pactos de união com a França, onde Bonaparte surgia com a auréola marcial de um novo Alexa ndre, prostrando as legiões da Prússia, as armas da Austrla e os soldados que ostentavam as lnsinlas da Rússia, Por– tugal, afagando a alvura das suas barbas, assistia a lenta corrosão das suas for– ças. Como um fantasma horrível, escondido em sombras arerrorizadoras, o perigo espreitava o govê rno do príncipe regente. Turbilhões e turbilhões de Intrigas, hordas e hordas de degradações eram as tintas que se espalhavam na paisagem administra tiva do reino. E
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