Revista da Academia Paraense de Letras 1953 (MARÇO V4 EX 5)
1ó· REVISTA JJA- ACADEMIA PARAENSE DE LETftAS. e da natureza. ou. como quer J . Middleton Murry ("The problcm ~f Stylc" - 1922 - pg. 7 1): "o estilo é uma qualidade da linguagem que comumca de modo preciso, emoções e pensamentos, peculiares do autor:•. E o ~stllo ser á per~ei.~o "quando a comunicação do pensamento ou da emoçao íor feita com e~atidao • A matéria prima do estllo, para O escritor, é a palavra. Cada um utiliza esse material comum de acôrdo com os peculiaridades do seu temperamento, da sua cultura da sua formação estética, dos seus dons. O estilo pode, por conse– guinte,• flutuar, segundo as tendências individuais, desde "a rigidez formal do espartilho de Escaligero", até a licença verbal da linguagem oral, ou a associa– ção livre das palavras em liberdade", ou volver ao justo equillbrio e clareza da palavra adequada para cada pensamento e cada emoção, como no caso de Flau– bert, ou a arrumação polida, Usa e pura, mas convencional, da prosa d e Ana– tole France. A vocação literária revela-se pela plena posse do "dom da pala – vra". o escritor utiliza e domina a palavra, como o músico domina os sons, o escultor o barro, e o pintor as cores . . . A palavra é a sua matéria prima • Grande escritor será aquele que, dominando integralmente essa matéria prima, for capaz de conseguir, na sua obra, a prodigiosa fusão do conteúdo e da forma, isto é, d'aquilo que Oscar Watzel considera a identificação e unidade da Gest:ilt com a Gehalt. É pois um atributo substancial e intrinseco da obra literária . É por isso mesmo que Buffon considerava o estilo como o próprio homem . Segundo êle, s6 as obras bem escritas pnssariam , à posteridade - e acrescen– tava: "le style est de l'hommc même". Sendo o elemento conectivo, por exce– lência, entre o fundo e a forma, pode ser definido, como prefere o Sr . Alceu Amoroso Lima, dêste modo conciso e exato : "O estilo é, ao mesmo tempo, o homem e a obra". Sendo colocado em tais têrmos o problema do estllo, seria honesto aceitar integralmente a tl:se do Sr. João Gaspar Simões ? A preva– lecer o seu ponto de vista, romancistas afinal de contas s6 seriam considerados Ponson de Terrall, George Oneh, Dumas Pai, Eugenia Sue . . . quer dizer, todos aqueles autores que nos habituáramos a situar f6ra da literatura . . . Convém, contudo, esclarecer que muitos romancistas da mais alta categoria foram acusa– dos de escrever mal. B alzac, Stendhal, Proust, Dostoievski, Dlckcns, Tolstoi, e entre nós Lima Barreto, apesar de escreverem tão bem, sofreram essa grave acusação: É possivel discuti-la, porque se trata aílnal de uma simples questão de gosto, ou de ponto de vista. O caso de Stendhal é tipico. Gidc, como já disse, admirava sem restrições o seu estilo . Mas Flaubert não o tolerava nem entendia. Proust não escrevia mal. Ao contrário . Apenas seu estilo se afas– tou deliberadamente da linha clássica da tradição francesa. Mas criou uma tradição nova, mais rica, complexa e original. Renovou o romance e a prosa francesa. Balzac nem sempre escrevia com bom gosto . Mns escrevia sempre com uma força poderosa. Costumava êle enriquecer o seu estilo de modo artificial : colhe.ndo t êrmos e metáforas nas enciclopédias, nos tratados cientifi– cas, nos dlcionãrlos, para fabricar tiradas eloquentes e belas . . . Era O seu fraco. Mas a~esar disso, seu estilo era f orte e duravcl. Porque era vivo, porque era o modo palpitante como êle pintava os homens e as coisas, porque trazia as fun– das marcas da sua personalidade . Escrever b em ou escrever mal, todavia, não é escrever sem estilo. Cada um afinal tem o seu estilo. Isto é, a sua maneira pessoal de se exprimir. E sem isto não há romance - nem há literatura. O "estilo" que representa, como disse, compensação do " complexo de inferioridade" literária, é o estilo precioso e retorcido, o contorslônismo verbal, 0 verbalismo sonoro e refolhudo, essa hipertrofia da palavra, tão apreciado P.ntre nós, e que esconde e disfarça a ausência de imaginação, a pobreza de fôrça criadora. E é neste sentido que o estilo constitui um problema psicológico : êle denuncia uma situação e oferece uma explicação para certas peculiaridades do romance brasileiro. O romance de Mach ado de Assis e o de Coelho Neto, o de Graça Aranha e o de Lima Barreto, o de Aluizio Azevedo e o de Manoel Antonio de Almeida não conterão, nos seus respectivos estilos, tão peculiares e tão ·diferen- •
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