Revista da Academia Paraense de Letras 1953 (MARÇO V4 EX 5)

• ÍtEVISTÁ DÁ ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS a mntéria prima das suas criações. O romancista brasileiro, para fugir às c_on: tingências dessa incomoda situação, quando não possui o gênio de um Mà– chado de Assis, sente o desamparo do ambiente, e apela para o recúr~o· már– ginal do colorido descritivo, do jogo verbal, das tiradas estilisticas, da pintura iterativa da paisagem . . . Na ausência doG t ormentos e inquiet ações psicológi– cas que fazem o interêsse do homem, i! preciso recorrer à grandeza telúrica da t erra . . . E o romance se dilui -e distende, sem interêsse, sem estrutura, sem conteudo humano . . . '• Literariamente permanecemos ainda pouco mais do que a quela "simples emanação da paisagem" de que f ala o autor de "Letras da Província". Entretanto - é preciso reconhecê-lo - nos últimos a nos, descobrindo o sentido do drama nacional - o s ofrimento obscuro das nossas p opulações · ~er– tanejas na sua á rdua luta heroica pela sobrevivência, nos e ngenhos decadérites do Nordeste, nas fazendas d~ cacáu da Bahia, nos seringais paludosos da Ama– zonia, nas tristes cidadezinhas dns Províncias do Norte - tragédia múltipla, si-- · lenciosa e grave que atinge difusamente largas áreas sociais do Brasil - alguns romancistas criaram um tipo de romance - o romance social, documentário da existência e dos costumes da nossa gente, mergulhando suas raizes n a llngua e na vida do povo, criaram eles sem dúvida um novo tipo de romance - romance de estilo oral, como o de Faulker, o de Hemingewy, o de John dos Passos. Esses romancistas, que nos vieram sobretudo do Nordes te - um José Lins, um Jorge Amado, um Amando Fontes, um José Americo, uma Rachel de Queiroz - sur: preenderam sem dúvida, na sua llrica riqueza, em t õda a s ua pureza e autentici– dade, o centro de interêsse de u.-na ampla zona da alma brasileira: as dõres, os' sofrimentos, as alegrias, as aspirações, as contradições e as tristezas das massas · infra-proletárias que vegetam abandonadas nos rincões longinquos do Nprdeste e do Norte , ..sem terem sequer exata consciência da sua condição humana .. : OUTRO PROBLEMA : O ROMANCE INTROSPECTIVO Terão os brasileiros aptidão para o romance de introspecção ? Els um outro problema psicológico que já tivemos oportunidade d e deba ter em ·fa~e de uma afirmação apressada do a utor das "Tendências do romance contemP.o– râneo". O ilustre critico português - a quem a jovem literatura brasileira tanto deve em simpatia, interêsse e compreensão - n ão foi feliz quando, ao estudar a obra de Gracilian o Ramos, afirmou que "o romance português pode subir a uma altitude a q ue o brasileiro dificilmente ascenderá". porque "só um europeu pode aspirar ao amadurecimento das faculdades de observação p slco~ lógica" essencial para isso. Segundo esse pensamento, no moderno r omance brasileiro está patente a incapacidade do escritor americano (não só o brasileiro, note-se) para descer ao estudo do homem no que n ele há de mais complexo. o assunto convida à discussão.. Vejamo-lo. O lega!lo psicológico, que nos veio de Portugal, pelo sangue e pela fo~– mação, foi o da extroversão nncional. Dest'arte, defeitos e qualidades, em nossa lite ratura, decorrem em grande parte dessa velha herança de familia. · Assim como a Jlteratura portuguesa, n a observação agudíssim a de Cas– telo Branco Chaves, é pobre em valor humano, a Jlteratura brasileira sempre padeceu da m esm a deficiência. A nossa arte tem vivido, como a portuguesa, "das oscilações das circunstâncias ; tem, pois, um sentido condicional e aleató- . rio" resultando dai a sua "fraqueza substancial e o seu debil valor humano•:, · o que também aconteceu do outro lado do Atlântico. O nosso gênio - C!)mo o do povo que nos formou - "é incerto, hesitante e vazio ; Inclinado à exteriori– dade, à superficialidade". Disso decorre a facilidade com que, como os por– tugueses e brasileiros, aprendemos, imitamos e adaptamos, e também dai pro– vém a nossa a usência de originalidade e profundeza. Vivemos, como os por– tugue~e~, "do eventual", "sujeitos à s ua oscilação e caprichos", conduzido~ a~,. ,

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