Revista da Academia Paraense de Letras 1952

REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS Bl As Grandes Tragédias Da Vida EDGAR PROENÇA Conheci aQuela história de amor e de tragédia. Mais uma no turbilhão do! casos sentimentais. Arma-as. tôdas.. quase sempre. o Destino. e é a Fatalidade que ;,s destroi. devorando-as. aniquilando os a nseios irreprimíveis. Atirando o homem contra o homem por causa de u ·a mullle r. Uma só ... i,: assim a história que e u conheci. Quem m'a contou foi êle, o meu querido ..migo Mário, que precisou desabafar-se comigo, eu que lhe sou majs do que um êlmi~o. uni irmão. Hã muito que eu lhP vinha nota ndo certo abatimento físico. Homem de espírito e de pensamento quase· ind;ferente às lutas do amor. de •coso equilibrado. eu nunca pensei que um traço de amargura lhe vincasse a alma. prrturba ndo-lhe o ritmo da existência. Numa dessas noites e·nluaradas encOHlrei-o a vagar n a rua. ao " léu do so- nho e ú merC'ê da vida... - Que '" Isso. Mário '/ Você, a estas horas, em lugares solitários ? - Com a alma solitária . .. - Você ? Te m grac;a I Um homem que duvida de tudo, um cético ? Um ho- mem que não crê nas mulhe res . .. - Um homem que tem hoje um d t·am a na vida, porque o Destino assim o quis. Fitei-o espantado. Mário acende um cigarro. Encaminhamo-nos para um b1rnco do jardim. A noite era uma poeira de luz macia e tenue, banhada pelos raios ~erenos do luar. . Ali, sob a cúpula verde de um ca·,amanchão, onde os jasmins noivavam com as rosas. dcrram:rnclo pelo ar 11m a roma sensual. como a dos tálamos nupciais. Mflrio. afetuosamente. comecou a falar. - Vais ouvir um capitulo dn minha vida. - Fala, e ntão. - Qua ndo daqui parti para o Rio. h as de lembrar-te que o Artur deixou ':'"R ,imante. Quando r egressei. ela. que sabia de mjnhas relações de amizade com rlc. e que andavamos juntos no Rio. procurou-me um dia em meu escritório. Pedia-me noticias de seu Artur. Uma a nsiedade indescritível p arecia atormentat– lhe o espírito. Reparei que era e ncantaclora, talvez um pouco doidivanas. Casada com um médico e oriunda de bôa família. Dei-lhe notícias do seu Artur e tudo pareceu terminar ai. Mais tarde, porém. .i:i próximo do regresso de Artur, encontrei-a na rua. Confessou-me que tudo aban– donaria para seguir com éle: que. novamente, deixaria a nossa terra. Artur chega. Idflios. O pai dele. sabendo dessa paixão, interpelá-o, levan– cln-o a confessar a té onde ia o seu afeto. isto é, o desejo irredutível de levá-la em s•1a companhia. O pai parece hesitar. promete1ido examinar o caso. Engano. Qua ndo vê Ruth, se sente de súbito empolgado pela sua beleza e mocidade, e é mais um que se escraviza ao seu coração. Convida-a a um encon~ro. Deseja apenas seduzi-la. Fala-lhe. mesmo, nesse sentido, sob a embriaguez mórbida de um homem que, esqu~cendo a ~ua condição de pai tenta dis putar ao fllho o di– reito de amar.. E insinua. e ntão, que o seu consentimento em viver com Artur depende de uma promessa dela. Como você sabe, Artur é muito jovem, é estudante e depende economicamente do seu pai, e agora, seu rival. A fuga de Ruth depe nderá e ntão desse consentime nto, e êste, da promessa dela ... Ruth repPle a inf/lmia. Atormenta-se. mas não deseja informar disso o seu jovem an1ante. - Por que? Receará, por ac:iso. que ;.1e se constitúa inimigo do pai ? - Ta lvez isso. Mas. meu caro, eis o ponto que me toca. O destino me põe no seu caminho nesse momento. T al como se pôs no meu, naquela torde, para uma conildê ncia irrcprimlvel. A confia nça que eu pude ter em ti, Ruth teve em mim. Mas. como iriam ser diversos os resultados ! E como isso. ele resto, era fatal 1 Lawrence disse que a intimidade entre o homem e a mulher só se concl'l!i pelo amor. enquanto que e ntre indivicluos do mesmo sexo se satisfaz com a am1- 7adc. Como, pois. havia de ser de maneira diferente ? . Ruth C!)ntou-mc tudo atormentacla. e pediu-me u m conselho. Que outro lhe pocler1a eu dar exc<-to que não cedesse ? Reluta. a partir dai, em seguir A1·tur. ~le desespera-se. insiste, por todos o~ modos. Afinal ela assegura que n ão podc•r.'I viajar com êle. Seria, efetivamente. uma fug11 espetacula r. demasiado escandalosa. Irn, logo em seguida, noutro vapor. Pairo acimR cte tudo, com os cord<-is na mão. E compreendo que ela o ama, porém quel' evital' o pai.

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