Revista da Academia Paraense de Letras 1952
REV1STA DA ACADl!:l\!IA PARAENSJ,; DE LETRAS 41 Qua11tas vezes, qua ntas, o cérebr o do homem não é um a rsenal de revol– tas. Tôda a riqueza de sens pensamentos, tôda a fortuna de seu patriotismo, tõda a opulência de sua coragem, que valem ? A incerteza de ser compreen– dido pelos homens que, . mais das vezes, compreendendo a honestidade de seu propõsito, tiram-lhe o direito legitimo de falar e escrever. Ninguém jamais poderá aquilatar o que seja, na essência e na verdade, a vida de um jornalista ! A mais bela de tôdas as profissões, a mais <lesgraçada, a mais insegura, a que geralmente se abrace à tuberculose p ara mais exaltar o espírito, com– paro o jornalista ao sacerdócio da luz. Se a professora ilumina o espír ito da infâ ncia, o jornalista semeia idéias no espírito das massas. Nobre e glorificadora profissão, a sua corôa de espinhos é feHa sempre do achincalhe e da maldade dos que õntem nos batiam palmas. Humanos até à medula, mais amigos dos outros do que de nós mesmos. sofrendo, sem nécessi– dade muitos vezes, as necessidades alheias, temos como única r ecompensa feliz, a serena tranquilidade d e haver cumprido honestamente como o nosso dever . Quando a justiça é a. ponta da baioneta, quando o direito é o "casse-tê te" oficial, quando a liberdade consiste exclusivamente no elogio constante e obri– gatório aos potentados, o povo. espoliado nos seus mínimos direitos de gente, jamais poderá avaliar de nosso sofrimento. Sentimos o espírito asfixiado e, um dia - é impossível suportar o cativeiro - ou. uma noite. quebramos as amar– ras da violência e, violentos na nossn razão, abrimos o peito u vingança da covardia que se apôia na lei das injus tiças e sentimos como que uma aleluia de esplendores e de ventura dentro de nossa alma. E a nossa consciência reluz. Nobre, desgraçada, s ublime, superior, gloriosa e glorificada profissão, é a ela que devo os instantes mais felizes de tôda a minha vida ! Aos 17 anos de idade recebi o batismo na Catedral de Luz do P ensa– mento do Pará - a "Folha do Norte". Bebi, na coragem e na convicção de P a ulo Maranhão, pena que é relâmpago e tempestade, ciclone e vulcão, os ensi– namentos salutares para a carreira amada e idolatrada . Balzac dizia que a sua fortuna estava no fundo dos t inteiros. O a u tor de "A sombra dos Jerônimos" afirmá que deve tudo o que é a seus livros. O criador de "A mulher da madrugada'' sente saudades quando lança um livro ao público . Eu devo tudo o que sou à imprensa. Meus livros foram escritos n as horas -de folga, ouvindo a cantilena, irritante e carinhosa, das linotipos. Com– preendi o mundo, avaliei à ambição dos homens, pude compreender-me melhor, nos meus defeitos morais e nas minhas loucuras de moço, analisei a a lma das coisas e o objetivo da vida nas lides de impre nsa. Foi a "Folha do Norte" a minha Academia de Ciências e Letras. A minha Universidade. Lã recebi o meu diploma de jornalista . Lã colei gráu de escrit_or e lá me formei em poeta. Símbolo de lutas boméricas pelas causas públicas, a "Folha do Norte" constitui para mim um motivo de coniiança no futuro e de cer teza nã grandeza da Amazônia. Olho-a com os olhos da alma, trazendo a consciên cia iluminada de uma vontade eterna de morrer falando e clamando por liberdade, liberdade e liberdade . Vejo uma profunda afinidade entre o jornalista e o escritor, porque o simples fato de transmitir ao leitor o panorama de uma tragédia já é uma demonstração de ar te. Se é desgraçada e linda a vida do jornalista, como é deslumbrante e trágica a vida do escritor ! A dêle nem a mulher que transformamos em nossa própria arte, que é o esteio de nossa inspirac:_ão, que é o _nosso mun_do à parte, a mulher que é tudo para nós, embora a sociedade a odeie e repudie, nem ela eterna no nosso coração, que é o nosso_sorriso porque a nossa espera nça, que é a nossa mentira, porque a nossa llusao, nem ela, r epito, pode compreender a nossa vida, diferente de todos, de uma <!_iíercnça expressivamente realçadn por Benjamin Costa ao tracejar-nos o tipo t ao humano quanto aristico de s ua ·'Gurya": "Se hã uma a rte soturna é a que praticamos. O pintor trabalh::i ao a r livre. O escultor assobia com o buril na mão. O músico cantn q uando compõe. O escritor não ~az nada disso. J::le se vê só, con– sigo mesmo, diante de tlma porçao de folhas rabiscadas, que voam e que alucinam. E se enerva e se exaspera I Vive sem a legria, e nter– rado entre borrões de tinta, enquanto lá fora o dia é lindo, h ú gente nas práias e o sol faz ~aravi_lhas sõbre o mar. Não gozamos as belas noites. O nosso luar e a lumpada da nossa mesa. E sob a sua luz queimamos uma vida inteira, os olhos e a sens ibilidade paro arrancar do cérebro senão ouro pelo _menos sangue. Sangue arranca– mos sempre. . . sempi·c. . . Esta glória dolorosa ninguém nos pode tii-nr" . E quando a literatura também. arranca o amor_ de umn 1,mlher, seja ela Mimi, Beatriz, Laura, Emllta, Marta, Loure ou L eida, tenha no ouro de seus \
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