Revista da Academia Paraense de Letras 1952 (Janeiro v2 ex2)

86 REVISTA DÀ ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS regra, termina, intimando-o a deixar em paz tal oficial. P ensam que o Juiz se intimidou, recuou em levar avan– te o seu propósito ? Qual nada ! E tanto isto é certo que, em tom colérico, defendendo seu ponto de vista, o ouvidor respondeu em cima da fivéla ao capitão general, dando em r esultado passar a discussão ao terreno das injúrias, dos mais p esados insultos, seguindo-se o- r eboliço da luta corporal. Sim, ambos foram às vias de fato, engalfinharam-se. E, agora, leiamos como J. Lúcio d'Azevedo descr eve a ocorrencia : "Ao alarido acodem os criados e gente da guar– da. Mal se defende o ouvidor com o prestígio do cargo, e, pondo mão no espadim, a custo alcança a rua, onde ainda o perseguem da janela as vozes do f ur ioso adversário. "Metam êsse homem na golilha", bradava o capitão general. "A go– lilha merece vossa excelência", o outro r etorquia, já em de– sordenada carreira. Tal foi o edificante espetáculo, que os habitantes do Pará presenciaram, logo nos primeiros tempos do govêrno de Mendonça". · Mas a luta não ficou nisso. O ouvidor, que também era de sangue nas guelras, ime– diatamente abriu d evassa contra seu antagonista, isso para desagravar a justiça real, ofendida na sua pessôa. Dessa devassa saiu coisa que nem queiram saber. Foi uma verdadeira lavagem de roupa suja. O povo, como é natural, acompanhava com interêsse o desenvolver dos acontecimentos, colocando-se a maior parte, numa velada oposição ao Govêrno, favorável ao ouvidor. E o assunto, resvalando para o fuchico, vivia na atenção, nas palestras de todos os moradores. Nas casas, rocinhas, repar– tições, ruas, travessas e estradas não se falava noutra coisa. Surgiram comentários os mais diver.;os. - ó Josefa, olha que se continuas dêste modo, a rosnar sôbre o caso do governador Mendonça 'Furtado e do ouvidor, eu não dou nada p'la tua pele ... - Ora, seu Jusé, tudo a cidade está a favôr do seu ou– vidô. Lhi juro que êle ganha . .. Junto à casa das Canôas, que ficava no Ver-o-Pêso, jus– tamente alí onde foi o Necrotério, assim falavam um por– tuguês recem-chegado do Reino e uma curiboca de avantaja– do tipo, que v inha sendo o a lvo das fosquinhas do luso. Josefa enganou-se e t anto enganou-se que, obedecida a norma de que o páu quebra sempre do lado mais fraco, não demorou muito o ouvidor foi recolhido à fortaleza por or– d12m de Mendonça Furtado a quem teve de en tr egar a devas– sa, sendo, a seguir, demitido do serviço público, transferido preso para o reino e degredado para sessenta léguas longe da Côrte. Pagou, assim, a ousadía de querer se medir com o capi– tão general Francisco Xavier de Mendonça, que como go– vernador ~o Estado do Maranhão e Grão-Pará, era o manda– chuva da epoca. O irmão do Marquês de Pombal, depois de uma v ida agitada em nos~a. terra, regr essou a P ortugal, sendo substi– tuído no exerc1c10 do cargo, pelo capitão general Manoel ;1;3ernardo de Melo e Castro.

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