Revista da Academia Paraense de Letras 1952 (Janeiro v2 ex2)
f!tVIS'i'A DA ACAOEM!A PARAENSI!: DE LETRAS 65 do enfermo aj oelhavam em torno ao seu leito d e dor e re– zavam, pedindo ao Pai Celeste o milagre ou a morte para findar o sofrimento de quem tanto bem queriam. Agora, tudo é diferente. A civilização avançou, a ciência aperfei– çoou-se. Existem os raios, as sangrias, os sôros, as tendas de oxigênio, as operações, tudo, tudo o que há de mais moderno. Para curar ? Não, quase sempre não, porque há males in– curáveis. São recursos científicos para humilhar o doente. para aumentar suas torturas. Quando a doença não pode ser solucionada pela ciência, somente o milagre. Comigo, Meira, vai suceder o que a civiliza«;ão defende. Minha .família, parn me ver vivo, sofrP.ndo, lançará mão de todos os recursos. Ah ! como eu tenho inveja do tempo de São F rancisco de Sales !... Despediu-se Meira. voltaram ao quarto do mestr e enfer– mo a esposa e a cunh ada. E Acilino de Leão, que sempre lhes fôra sincer o, falando-lhes a linguagem cristalina da verdade, nada escondendo delas, objetivando conformação para tudo aquilo que o destino costuma fazer de surpresa, disse-lhes o que tinha, salientando não temer a morte, já que havia cum– prido com o seu destino na terra, mas não escondendo o pa– vor do sofrimento atroz que o aguardava. Na confidência do mestre temos uma bela página de literatura. Quanta verdade em tudo o que disse e quanta amargura nas entrelinhas. Com quanta eloquência Acilino de Leão não há de ter dito aquilo. Os alunos da Faculdade de Medicina que ouviram a sua última aula nunca mais poderão esquecer o a uto diagnósti– co. que Acilino de Leão fez ao lhes falar sobre cancer no fí– gado, terminando por estudar , com erudição e elegância de linguagem, o drama de um m<.>dico que fosse vitima daquele mal atroz. O médico é um tor turado e um infeliz, quando consciente de seu sublime dever. Encontro, portanto, motivo suficiente para sentir que no âmago de todo médico existe uma paixão prof unda pela poesia, pois é pelos versos que os homens re– velam toda a angustia de seus sofrimentos íntimos. Alvaro Nascimento, meu diléto amigo, cirurgião, clínico e parteiro de valor inegável, ginecologista dos mais comple– tos da nova geração, escondido ainda numa modest ia injus– tificável, conversando comigo há dias sobr e a morte de Aci– lino de Leão me fez observações sensatas sobre a vida dos médicos, quando tornei dele conhecida a idéia que faço da d esgraça sentimental daqueles que curam. O médico é um torturado_ porque sofre com o sofrimento do doente, sofre pelo sofrimento dos parentes do enfermo e tem que ser o sacerdote da resignação do paciente e membros da família q uando se impõe revelar o tremendo fracasso da medicina par a a cura. Disse-me ele que Acilino de Leão deve ter sofrido mui– to, mais do que se possa imaginar, durante anos a fio. Des– creveu-me, nos seus mínimos detalhes, a enfermidade de Acilino de Leão. E me observou que a tortura do médico, quando este tem consciên cia de seu dever e não se envaidP.– ce do título como Acilino de Leão fazia, e como Alvaro Nas– cime,nt9 fa1. do seu Grandio:;;o sacerdócio, atinge ao cume do
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