Revista da Academia Paraense de Letras 1952 (Janeiro v2 ex2)

REV.:ISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS • • • 1 gurado "buona sera". Fechei a gay~~ª e deixei que me empolgasse êsse estado indefinível, porém muito conheci– do de quem, após um dia- de inte11si:10 labor intelectual, vê-se liberto de obrigações por uma dúzia de horas. A atenção, quase diria a vontade, escapuliu-me, a ma– neira de potent e estação emissora que sai do ar, os ner– vos, sem direção, distenderam-se ràpidamente, os mús– culos incontrolados relaxaram-se por completo e o corpo quedou-me esquecido na polt rona. Os bastonetes das re– tinas, todavia, permaneceram despertos e minha vista, a vagar pela sala, acariciando os móveis, os livros, os ins– trumentos de trabalho, tudo aquilo muito querido, chegou à janela, atravessou-lhe a vidraça e percebeu, lá fora, os flocos de neve a tombar. Novamente eu assistia a uma nevada verdadeira e o espetáculo que t ant o me fascinara desde a infância, quan– do contemplado nas telas dos cinemas ou at é mesmo nas fotografias das revist as e que acabara de seduzir-me, quando o conhecera de visu, concorria no momento, para completar a euforia do dolce far· niente. Certo de que, no dia seguint e, aquêle cant inho int er– nacional, implantado por Novelli no seio do Piemonte, re– ceber-me-ia com o carinho de sempre, despedi-me da "sala dos estagiários" e saí ao encontro da neve. Lentamente, atravessei o parque da Stazione e per– corri o quarteirão da Via BASSI a sentir sob os pés, o t apete macio que cedia, de quando em vez, engolindo-me os snow-boots até as orlas dos canos, a sentir nas faces, os afagos, ora leves, de um floco que apenas caía, ora mais fortes, de um outro que o vento soprava rudemente. Sob os flocos de neve a tombar, meus sentidos aguça– dos evocavam veillées de noel, réveillons de nouvel an e noitadas de carnaval, em imagens mais vivas do que ce– nas de televisão, porquant o para estas ainda não conse– guimos o concurso inestimável dos odores . Mil canções, no gênero de "Whit e Christmas" e "Si– len t Night ", cantavam dent ro em mim e por t ôda parte eu enxergava a conífera simbólica, com as agulhas bran– quinhas de neve, com os ramos cheinhos de luzes, de brin– quedos e de orna tos, cada qual mais brilhante . Eram pi– nheiros pequeninos, pequenos e grandes, em cima de me– sas, em meio a salas e salões, no cen tro de praças públi– cas, eram pinheiros artificiais e naturais e dêstes eu sen– tia o agradável aroma da resina a exsudar . Ao derredor dêles, cirandavam crianças felizes, a en toar cânticos na– t alinos, enquanto crianças infelizes os contemplavam de longe, com olha res que pungiam, quer espelhassem a re– volta contra a sorte cruel, a lavrar-lhes no intimo, quer apenas deixassem adivinhar a conformação só possível n as almas infant is. Por entre as notas harmoniosas de carrilhões, instala– dos em torres de basílicas magníficas, eu escutava sinos humildes, a repicar festivamente, no alto de campanários aldeões . E o convite do bronze pa ra os ofícios da meia noite era a tendido pela gen te de boa vontade que, pressu– rosa, buscava. os templos, cujas naves não tardavam a en~ -4;

RkJQdWJsaXNoZXIy MjU4NjU0