Revista da Academia Paraense de Letras 1952 (Janeiro v2 ex2)
REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS 167 benefícios sofridos com delícia , as a n timonias que dividem , e a demagogia que desorganiza caráter, tõda a iniquidade, tôda a objeção contemporâ nea. Telas irrompiam, amargas e sinceras, not.·mdo a múltipla ner– rose do espectro socia l, os seus atos incoordenados, a sua solidão moral sómente refletida por ..espectros simila r es. . . Aguçava-se acerbamente a Ironia dos escutor es movidas pela piedade, por um incontido desejo de renovação e harmonia. Os que se aproximam das obras mais belas e significativa d êsse mome nto lite rá rio sen tem toso a triste tonalidade cinzenta que elas diluem, para causar uma impressão de tenaz, uniforme pesadume e súbito calafrio Inquietante denuncia-lhes que a terra a pa lmilhar é de mortos, acidenta da e in– l lcmente, elas a poesia afetiva dêsses liv ros cruéis tinham um en– canto penetrante : ao contrá rio dessas cate drais antigas de que Renau dizia que entristecia porque e ram claras, essas páginas nos ]lenetram e nos comovem, nos a gra dam e nos felicitam ]Iorque são sombrias. Demais o pessimismo quase desesperado que elas su sci– tam ocultava a aspiração, a enritimia final, a preocupação Já evi– dente dos problemas morais, e nas inst.itu içúes de mais em mais de– licadas e profunda s d os artistas já murmurava e cantava deliciosa– mente o advento próximo a a rte de amo r , simpatia. O limáplo dos desgraçados la ser escrito com a s aspirações dolorosas, os martírios de tôdas a s raças, c os roman ces de costumes, de anf•lise e de idéias ia agravar, com um grande grito de protesto, o sofrintento universal. DesaJ>arecera da represent ação estética da Vida o pessimismo im- 11assivcl, a observação insistcntcn1ente irônica dos mestres que ha– viam fortificado o pensamento novo. A visão triste mas inalterada de Flaubert aliava-se nos sous n1cll1ores discípulos aos sentimentos de comiseração, de e:nternecin1cnto, de revolta ama rgura ante as insuficiências, as injustiças, as opressões sociais. Mas essa simpa– tia trazia expansões e exigências até então confusas ; depois do homem abandonado e miserável, o mundo exte rior v em trazer também o seu depoimento hostil ou benéfico, e a simpatia literária en volverá as coisas inanimadas na sua aspirai arden te, e estabele– cerá as mais vivas e subtis correspondências entre o coração e a Natureza. o advento da palsai;cm na arte moderna, ns mil expressões co– movidas com que os 11in tores a n1ovimentam e iluminan1 indicam n esse momento, o caminho pe rcorrido por essas idéias generosas. Como está agora afastado do homem antigo, que vivia harmo– niosam ente, d esconhecendo comPletamen tc o pernicioso e divor– ciador dualismo moderno do corpo e do espírito, possuindo uma filosofia sem mistérios to rturantes sem ansiedade, amando uma a rte que e ra a t ranscrição fiel da vida nacio naJ harmoniosa e h erói– ca, como est.'i a fastado do tempo do Grego de . Péricles, do moço dos Diálogos de P latão que pa!es~rava familiar!"ente com Sócrates antes de encaminhar-se ao Ceram 1co 11ara sentir suas belezas das cortesãs, o com plemento ª!limado das o ut ras belezas a ladas que lhe • povoariam o es11írito, o ser moderno, vibratil, inquieto, apaixo– nado volubllmente, contendo no seu sistema nervoso perpetuamente agitado as idéias contraditórias ele uma época incoer en te. Mas o seu espírito exasperado engendr~u un_1a _arte c1ue o. mundo antigo infellzmentc não conheceu, na 1mpotcnc1a de a criar. Agora, por entre.a sensi~iliclade contemporânea assim formada, e dia a dia n1ais ansiosa, mais penetrante e acolhedora flui, recon– fortante a ampla corrente da simpatia literária, que desce de altas verten te's que promana, maravilhosa, do monumento granítico e esculturai de 1.'olstoi, que e nvolve tumultuàriamente Zola, que canta em tõrno de Daudet, e, c ristalina, em revoltas melodiosas, modela a obra de Anatole France, e pe rcorre a gora, vertiginosa– m ente a estepe russa, encantando os "ex-homens", com a melodia bárba:a e con1ovcdora de Gorki. E é curioso, quase anômalo, o espe– táculo de uma literatura qu~,. a r1!1ada . de ilnplacávc is ironias, pro– clamando a ação revoluciona ria, 1dea hzando ou simplesmente de– fendendo os degra dados, destruindo a au toridade civil e relig iosa, aconselhando o amor livre e a vida Integ r al, recebe em recompensa a mais ampla sanção ao seu d eslgnlo libertário e o manifesto aplauso das sociedades que ela abala e vai d estruindo, livro a livro, pa ra o sagrado trabalho de um futuro recon strutor . É que êsses liv ros demolido res, mas conscienciosos à figron omla nervosa e atormentada do homem que nos somos d estaca sincera vigorosa, sem sombra. Mas nã o nos iludamos com o ]lrcstíglo d ess~ literatura. A grande arte só deve ter como ideal soberano a criaçã o da B eleza, sem preocupação de apostolado, sem ambições didáticas. A obra dessa arte de oposição já é admirável mas inevitavelmente transi-
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