Revista da Academia Paraense de Letras 1952 (Janeiro v2 ex2)

RÉVÍSTA DA ACADEMIA PARAEl'sSE DE LETRAS 107 fios e nas toadas ca1p1ras e que, segundo o poeta "escondem a alma no bôjo das violas". Conjuguemo-nos pelo Brasil, senhores . Da inteligência dos seus filhos é que a nacionalidade espera. E nós que no Pará simbolizá- mo-lo, iniciemos a jornada. · Construamos por meio da propagação intelectual uma Pátria grande, majestosa e invencível, cheia de esperança, de glória, de sonho e de bondad!!, para condizer com a esmeralda, o topázio, a safira e o marfim da sua Bandeira que há de sempre flutuar sôbre as nossas cabeças, ao clarão resplandecente do sól dos trópicos e à luz das estrelas que s ão os olhos de Deus, velando-nos através da cortina escura da noite, pela janela eterna do Cruzeiro. Em matéria de literatura, quando se trata de vôos intelectuais dizem os zollos - o prosador publica u m livro : o poeta, uma versalhada. Haverá, porém, absoluta coerência na formação dêsse juízo? Creio ser uma simples questão de paladar. Mais das vezes a formação de tal juízo origina-se de um juízo em formação, dêsse que, como disse Augusto dos Anjos, " . . . apenas enconIrou na idéia gasta o horror dessa mecânica nefasta a que tôdas as cousas se reduzem". Isso porque há tanta poesia na profundeza de criação de quem escreveu o ..Manuscrito Materno", como na de quem escreveu ºEs– pumas Flutuantes" . Há tanta comédia divina na poesia do "O Ho– mem que RI", como há poesia na "Divina Comédia de Dante". Ler os dois livros é mais fácil do que encontrar essa poesia. Encontrá– la é distingui-la da prosa e do verso. É mais agradável e mais cômodo ao espírito a leitura de um drama escrito em quatorze linhas do que em quinhentas páginas. Há versos que a gente lê como se estivesse saboreando "fruta lei– tosa rachando de bôa", bem o disse Bruno de Menezes. Também há livros em prosa que são como êsses pastéis aos quais os estudantes, n a sua espirituosa pilhéria, apelidaram de "engasga gato". O Brasil possui uma riquíssima biblioteca, produções de escri– tores estranhos ao nosso idioma e que por ai boloram abarrotando as livrarias e essas por sua vez clarinam aos quatro ventos a impa– triótica propaganda do valor intelectual dêsses "penetras", numa indireta mas flagrante diminuição ao nosso gráu de cultura e cria– ção espiritual. E os interessados por essa maneira de comércio, visando antes a parte rendosa da matéria, vão cavilosamente humi– lhando no mercado das letras os anseios e os vôos dos nossos ensa– ístas e também dos velhos e renomados publicis tas compatricios. Alegam também, que não temos meio cultural, que não temos escolas, que não escrevemos, que n ão produzimos e que o nosso Pais está ainda muito distante da Civilização . Referem-se à civili– zação européia, de quem, na opinião de muita gente, a educação é "filha legitima·•, convencidos de que lá os Camões, os Hugos, os Anatoles, os Shakespeares e tantos outros exponenciais da cultura transoceâ nica, continuam genealógicamente dando frut os prodigiosos. Essa lógica absurda, mas convincente, está dominando, infil– trando-se no raciocinio de certos escritores brasileiros, veiculada, observamos, pelo processo, digo melhor, pela mania das traduções amorfas e desinteressantes de muitas obras que por ai estão em– panturrando as vitrinas dos nossos livreiros. Enquanto os tradutores brasileiros transplantam em o nosso idioma centenas de livros de escritores estrangeiros, demonstrando simplesmente que sabemos navegar "fora da Ba rra", êles, de ma– neira irrisória, catam na volumosa literatura sul-americana apenas dois sonetos : "As pombas", de Raimundo Corrêa e "Ouvir estrelas", de Olavo Bilac . Todos os dias os escritores brasileiros, aliás, escritores de classe, enchem as colunas dos jornais com poesias laxativas, cr ônicas e contos enfadonhos traduzidos de várias llnguas, quando mais pro– veitosamente deveriam produzir, dada a capacidade de que são por– tadores, coisas nossas, páginas brilhantes, subsidiárias para a nova geração que se levanta no Brasil, para os que se devem ufanar de conhece r os fatos, os mistérios e as mara vilhas desta gra nde e abençoada nesga de te rra da América La tina . Somos já um povo de Hngua emprestada ; a bandonemos, portanto, a incongruência obsoleta de fazer figura com o ouro alheio (quando é ouro) . Use• mos a nossa prata, a prata de casa, fácil, corrente, nacional, porque

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