Revista Bragantina - 1930 (n.3), 1931 (n.4-5), 1950 (n.6).

ÁQUELI_.(A NOITE ... (9 Ao BENCÉPER - a expre!são mais viva da bohemia em minha terra - ~ a simplicidade desta ·p~gina realista. Eu entr~ra, ~ela primei ra vez, no (<dancing> da Rua. . . nao sct se pot· casualitt!lde ou se mesmo á procura de uma distracçitu nova, inédita, sensa– cionnl , que me satisfizesse o es pírito cançado. * * * Foi perdoavel, portanto, o 1,atun1l acanlrnmento com que eu penetrei áqlwlle retiro de mulh0res deshonestas e de homens ho nrados : dessas mulhe– res que, na apparencia, são manhi\s de outornnó mal despertas, rnaF, no fundo, no positivo de uma triste realidade, sãn rosas scro perfume e scrn lrns te ; e desses homens que fa,rnm da sua honra e da frn– queza das_ mulheres um «guiguinol» íntere5sante... * * Pouco valem os cnnfrnnt."s ... Eu entrára casualmente naquull c «dancing». * * * Na combinação p, ,1lyd1rnrnirn das larnpadas lucil– luzentes aquelles gl11bulo s acccsos pareciam boccas em bocejos de luz. *** Ao fundo do salüo, daquel!B amplo salàn illumi– nado onde algum homens bebiam e gesticulavam numa expansividade de cLrins, um ~jazz• atirav a aos quatro ca ntos o rythrno de,compaswdo do ulti– mo /( fox> sensacional dn, ôpoca. Alguns pares dansavam. Algnns pares <lesliíl:t– vam, regarnboleandll os corpos, rnovirncntanrlo os quadris, unidos, b,irn unidos, corno se de;cjassem transpassar um ao uutro. * * Arredei, familiarmente, a cadeira dn unv1 das hum idas bancas de marmore postas e:11 desa! inho a um lado do salão. S1111: familiarrµente. QuQ ctia– bo ! Pelo menns já havia reconhecido ali, entre as poucas pessôas presentes, o commendador Rodri– gues da Silveirn, obesso e arrngante, espaventosa– mente arrog-ante, dentro do sou (<smoking)) caris– simo e dos seus 60 unnos ... * 'f- * Lancei um olhar observador em torno d0 salão illuminado. Diminuta frequencia. O rninimo dn ho– mens. Média maio1· das mulheres. Das mulheres quct á noite são mais procuradas porque nem todas as noites ellas são as mesmas . Dessas mulheres que se realçam sob o esplendor das sedas e das joias e vivem a disfarçar, na expontaneidade de um sor– riso e na simplicidade de um gesto carinhoso, mas voluvel-a dôr que provem de um destino anniqui– lador, irremediavel. Dessas mulheres que não p_fn– sam no dia de amanhã porque, dentro de suas amargtll'as occultadas, são mais positivas, são mais 1·esolutas e mais raciocinadoras que muitos mortaes: oii hoje O'U nunca! Dessas mulheres que appa– r•'ntam dcscrn hecer o soffrimento que humilha e põe cachoeiras crystallinas de lagrimas nos olhos ; e a penuria que pondo riscos negros de pavor no claro-escuro dos albergues, abate, maltrata, conso– me, e enfraquece, aos poucos, o org·anismo ... Dessas 1 mulheres ... ... mas quem não sabe qne essas mulheres são tào infelizes e tã.o desg;raçadas? ! Quem dirá que ellas não hão de conhe,;er, finalmente, a Vida: a vida-tPrmento, a vida-amargura, a vida ch,s que não podem sorrir para o mundo porque têm pavor da indifferenciosidade CPm que elle espalha as suas miserias anniquiladoras ! ? J\Tinguem. Tal vez o commendador Rodrig·ues da Silveira ... * -Pensa'? -V<ilvi--rnc, assustado, como quem está com o pensarncn to além ... Tin lia ao flanco um vulto es– guio, mui to esguio, qunsi sombra, quasi mulher. - Não, Observo ... - ... a indiflerença dos homens? - •.. a felicidade das mulheres, . , * * * Elln se chamava Georg·ette. Sim. Talvez fosse Georgc,tte por aqnella noite. Na antctrio~, chama– m-se Luiza. · Amanhã, certamente, terá outro nome mais suave ou mais exqui3ito. Outro nome e outro vestirlo. Outro vestido e outra alma .•. Mas, e pre– ciw que assim seja. Do contrario : a impopulari– dade, o insuccesso, o abandono dos homens .•. Dos homens que dão tudo por um novo vestido e por um nome exquisito ... Dos homens que resva– lam ao mais baixo nível moral Li-partindo as suas posses e suas forças physicas entre a esposa e a prostitut11sinha cynica , que a ttrahe com um sorriso, entrega, indifferentemente, o corpo de carnes flaci– trí,s e brancas para poder pousar as ganas nas algi– beiras fertieis e sanguisugueal-a toda ! * -Allô ! Era o meu velho amigo Alves Franco que chega– va e abancava-se ao meu lado, fai.endo com a ca– beça um chamado ao garçon. -Ha muitas horas aqui'? -Ha momentos. E para o garçon que chegava: -Whisky! Tínhamos já a confrontar-nos Oi! calices com o liqriido entorpecente. Alves Franco solveu.,o lentamente e, apõs, tocan– do-me ao hombro : -Que adoraveis formas as daquella francezinha. Vês? - Qual ? interroguei, procurando divisal-a.

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