Revista da Academia Paraense de Letras 1964

REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS Já então Sílvio estava em pleno fastígio de seu genio e longe ainda daquêl~ "monstruoso ano" como chamaria 1914, em carta a Afonso Celso, 10 dias antes de morrer, numa pre– visão estranha e agofrenta de bruxa auguratriz, do seu fim. Senhores Acádêmicos. Não foi sem renúncias, nem amarguras, que Silvio Ro– mero chegou à plenitude e à realização da sua obra, senão que longa, áspera e dolorosa, a sua trajetória, porque teve de abrir o seu próprio caminho, deixando por vezes um pouco de seu orgulho, do seu sangue, de sua vida, em certos encontros e em muitas encruzilhadas, mas sempre senhor do seu destino, como quem sabe até onde ir, per aspera ad astra e tem fé em si mes– mo, em sua fôrça, em seu valor e como exigia Rafael Barret, em el valor de los puiios en la lengua y debaijo del craneo pues la unica virtud del hombre es el val9r. Quem percorre a obra monumental, multiforme, frag– mentária mas grandiosa de Silvio, pelo conteúdo e pelo plane– jamento, sente que êle viveu para crear, para alargar horizon– tes, impor diretrizes e rumos à cultura brasileira, _com aquela potência de vontade de que falava Nietzsche, orgulhoso, por vezes, como um solitário, por vezes ingênuo como um ilumina– do e não raro com a melancolia dos ql:le são temidos mas nunca foram compreendidos. Eis porque, maior que a sua glória foi a sua "agonia", no sentido trágico e esquiliano de luta contra êsse "patos'' inexo– rável que é o destino. Aos 60 anos, exausto e doente, escrevia a Almachio Di– níz: "desde que me jubilei, tive a idéia de me pôr daqui para fora deixando este pasto à ação exclusiva do Zé Burríssimo. Com 60 anos e artério-esclerose, não passo dum velho cangaço quasi inválido". ' Através da ironia e do sarcasmo, ha nestas lbbas, como que, um traço fundo de tristeza, a desolação dilac,?-rant~ dos que se despedem para não mais voltar. E buscou então O so– cêgo bucólico de Juiz de Fora, onde esperava como dizia con– cluir a História da Literatura e o Brasil Social e recomeça~ len– tamente a Vida ... Mas êle bem sabia que essas palavras, já não tinham sig– nificação e soavam aos seus ouvidos, como aquele refrão dolen– te de Hamlet: Worqs, words, words, only words. No entanto, amda lutou 3 anos, e com a teimosia e agres– sividade dos bons tempos de Recife, sans peur et sans rep– proche! como Bayard. Porq.ue a luta sempre o empolgou. E ê~e tena de mo~~·er, como viveu, lutando, defendendo, menos a vida que nada Ja lh~ contava, mas os seus princípios, as suas -89-

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