Revista da Academia Paraense de Letras 1964
REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS e que a guerra vinha encher de um conteúdo novo, singular e apocaliptico. A guerra, que era a morte, trazia paradoxalmente con– sigo um novo sentido para a Vida, aquele sentido faustico que Goethe, contrariando o imperativo bíblico, de que, no princí– pio era o Verbo, 1sto é, o Ser, sintetizou, ao proclamar pela boca de Fausto - no princípio era a Ação, isto é o Não-Ser. E então, a minha geração ouviu estarrecida, aquelas palavras trá– gicas de Paul Valery, depois da hecatombe que assolou a Eu– ropa: nós cornpreen·dernos agora que as civilizações podem pe– recer. Spengler confirmaria Valery ao salientar, com aquêle rigorismo de exegeta da História, que a civilização ocidental havia passado e os seus problemas eram de óra em diante, os da vida prática, de adaptação social e não mais de especulação filosófica ou de produção estética. Silvio apesar do seu ger– manismo, por certo não compreenderia Spengler, pois procla– mára que a liberdade da humanidade consiste em ir-se subtra– indo à pressão do despotismo. Do despotismo da natureza, que a fustiga de todos os lados e contra a qual ela vai obtendo tri– unfos, por meio da indústria; do despotismo dos tiranos, de todas as formas e tamanhos e que se apossaram do poder de dispôr dos seus destinos e contra o qual ela vai obtendo desforras, por intermédio da ciencía e da revolução (Estudos Fil. e Direito pg, 23). Quem assim doutrinava, do alto de uma cátedra, não po– dia ser partícipe da derrocada de uma civilização. Ficaria corno voz isolada e estranh~, voz da consciencia, que, às vezes se ouve, quando não é mais tempo de se ouvir. E mais feliz do que Spencer, que chegára aos albores do século 20, mas para amal– diçoá-lo e morrer, Sílvio não teve que se defrontar, para resol· ver, dentro dos princípios de sua filosofia, com os novos pro– blemas que a guerra vinha trazer à geração, que êle deixava, numa encruzilhada, entregue a desconhecidos destinos e a ru– mos incertos. ~ no entanto, força é convir, Silvio não foi um filósofo. Um enamorado por certo, das subtilezas da filosofia, para as quais se preparou com um luxo de erudição, que irritava o meio acadêmico de Recife, um vulgarizador das correntes no– vas do pensamento no século 19, com um senso crítico e uma poderosa dialética, um amante da controvérsia e da discussão filosófica de que d~ por vezes, urna esquernatisação vigorosa e não r aro, seducente, um agitador de idéias no campo da socio– logia, tão pouco conhecida em seu tempo, e negada até por ta– lentos da altura de um Tobias, um scholar, para dizer com os inglêses, um estudioso das causas geradoras e das causas fi– na.is do fenômeno jurídic?, que procurava sondar e acompa- -79-
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