Revista da Academia Paraense de Letras 1964
REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS Sob Carlos X ocorreu fato mais grave. Pelo seu caráter geral, merece encerrar êste pequeno ensaio sôbre a liberdade nas Academias. O Rei enviara à Câmara projeto de lei sôbre a imprensa, cuja aprovação abafaria tôda independência de es– crever. Por propost;,l de Chateaubriand, a Academia deliberou apelar ao Govêrno contra o projeto. Incumbido de dissuadi-la, um acadêmico ligado ao Trono, Quélen, Arcebispo de Paris, concluíu sua advertência afirmando que, ao envio do apêlo, seguir-se-ia a r:r.orte da instituição. A Academia não recuou. Redigida a súplica - como então se chamava - o Rei demitiu todos os redatores que ocupavam funções públicas e não rece– beu a comissão encarregada de entregar-lhe o documento. Pouco depois, o Deputado Royer Collard derrubava o projeto no Parlamento e atingia uma retumbante popularidade. Quase ao mesmo tempo, morria Laplace. Por unanimidade de· votos - uma das raras unanimidades de sua história - foi eleito para substituí-lo exatamente Royer Collard ... Creio êsses exemplos suficientes para comprovar a voca– ção libertária das academias. Hoje, entretanto, isso não basta. Nestes amargos meados do Século XX, as liberdades individuais sómente se completam, se mantêm e se justificam quando postas a serviço da justiça social. Apenas no entusiasmo pela obtenção desta é imprescindível evitar o esmagamento daquelas. Se a desigualdade entre os homens, como entre os povos, é um problema intransfe1ivel da nossa geração, não o é menos o respeito à dignidade inviolável da pessôa humana. Compati– bilizar êsses dois objetivos tornou-se necessidade tão aguda que um homem lúcido dela não se pode mais omitir. Até a I Guerra Mundial supunha-se que a literatura deveria ser colo– cada ao lado ou acima dessa crise. É, por exemplo, o que pen– sava Gustave Lanson quando assim concluía, em 1920, a sua História da Literatura Francêsa: - "Alguns escritores da extrema direita, católicos e monarquistas, e alguns escritores da extrema esquer– da, socialistas e revolucionários, são os únicos a não praticar hoje a religião da arte acima de tudo. . . De uma maneira geral, a doutrina da arte pela arte não é mais contestada, se _por ela se entende que o obje– tivo do escritor, como do pintor, do escultor e do músico, é criar uma obra bela e que nem o fnterêsse social, nem a moral, nem mesmo a verdade têm algo · a exigir do artista em detrimento da beleza". - 286 -
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