Revista da Academia Paraense de Letras 1964
REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS cutíveis, cujos elos comuns pareciam-me ser a decadência, o imobilismo e a senetude. Era, talvez, uma impressão seme– lhante à de Anatole quando dizia que, se no Pacífico os antro– pófagos comiam os velhos enquanto na Europa faziam dêles acadêmicos, isso apenas significava um abrandamento do ca– nibalismo. . . Ou parecida, no Brasil, à de Afrânio Peixoto, quando assim se queixava da sua precária imortalidade: - "Que é de fato um a_cadêmico ? Dois discursos: - um, de corpo presente, no dia da posse, e outro - ai de nós ! - já ausentes, na posse do sucessor . . . ". Havia, entretanto, pêso suficiente no outro prato da ba– lança. Viera minha escôlha de Jarbas Passarinho e Santana Marques, dois amigo_s que, embora fraternais, simbolizavam, em nosso escasso círculo intelectual, o que existia de mais autô– nomo, lúcido e irreverente. Jarbas e eu fômos meninos juntos Por mais de trinta anos venho testemunhando sua coragem, seu talento, sua indomável dignidade. A memória da infância larl a lado certamente influiu nas carinhosas palavras que me acabou de dirigir. Mas essa turbação emocional não lhe afetou o idioma castiço nem lhe diminuiu o fulgor no esplêndido re– trato da época, dos lugares, dos episódios e das criaturas entre os quais deslisou a nossa juventude._Felizes os que encontram companheiro assim antigo, exato e capaz de transfundir em suas pálidas biografias um viço tão sedutor. Tudo isso, porém, foram decorrências da escôlha, não as suas causas. De Jarbas, autêntico e livre como êle só, seria imerecido supor que a pre– ferência fôsse apenas sentimental. Quar.to a Santa Marques, talento . perdulário na conver– sação, no jornalismo, no bom gôsto da frase curta e insubs– tituível, quem poderia suspeitar de uma indicação menos sin– cera ? D'êle, nas lembranças mais' remotas que me ocorriam, misturavam-se uma sôfrega curiosidade pelos sueltos de pri– meira página, com letra graúda, espaçada, e um indefinível receio de ser alvo daquele ponteagudo sarcasmo com o qual, em quatro linhas, desnudava os pequenos ridículos que jaziam inconfessados 'no íntimo de todos nós. Era pessôa de quem se poderia esperar um silêncio de ironia, nunca uma palavra de lisonja. Analisando dêsse modo os que me convocavam para a Academia, reconsiderei o primeiro impulso negativo e pesqui– sei como poderia justificar o meu ingresso. Logo descobri que as Academias chamam-se de letras mas também se interessam pelos homens- de ação. Em França' de onde retiramos os modelos destas agremiações, nunca ela~ se restringiram aos escritores, incluindo, ao contrário, militares como Lyautey, Foch, Pétain e Weygand; cientistas como Buffon ] - 279 -
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