Revista da Academia Paraense de Letras 1964

REVISTA DA ACÁDEMIA PARAENSE DE L ETRAS razões de aqutescer a recusar. Par ecia-me invencível a sensação de surda 'incoerência entre tudo quanto sou, e desejo ser, e o que vêm sendo, em tese, pelo mundo afora, embora nem sempre o queiram, os grêmios desta espécie. Quanto a mim, há mais de 20 anos outra coisa não tenho sido além de professor e advogado. Recordo, é certo, com ter– nura, breve trêcho d·a juventude durante o qual Machado Coêlho e eu coordenamos o entusiasmo gratuito de uns poucos compa– nheiros para êsse discreto milagre provinciano que foi a revista '·Novidacte". Aí, sim, o escrever, bem ou mal, era minha tarefa cotidiana. Faltava papel, faltava dinheiro, faltavam leitores, porém matéria não faltava na tipografia. Somente romance e versos nunca fiz. Mas do pequeno conto ao registro de aniver– sário, da entrevista com Getúlio ao louvor de Adalcinda, do artigo de abertura à~ notas desconexas e elásticas para fecha– mento das colunas - acabei me acostumando a produzir um pouco de tudo. "Tudo", aliás, era o título da página que eu assinava, espécie de "bric·à-brac" literário, onde tanto se poderia encontrar uma citação de Verlaine como um agressivo comentário sôbre administração municipal. A guerra e a for– matura fecharam, em 42, essas humildes veredas intelectuais. Daí por diante foram as responsabilidades da profissão, mais tarde as da família, o magistério secundário e superior, 0 es– critório incipiente reclamando todos os momentos disponíveis, a palavra oral ou escrita sempre apressada, o discurso de im– proviso, as aulas de cada dia, os arrazoados de cada processo. Nunca mais me sobrou o lazer imprescindível à leitura desin– teressada, à meditação sem angústia, ao cultivo da língua pela sua estética tantas vêzes irreconciliável com o uso afoito e preocupado. Do ponto de_ vista da literatura, portanto, minha eleição seria uma injustiça aos raros espíritos que, entre nós, lhe dedicam suas melhores energias, com pertinácia tanto mais louvável porque anônima e mal recompensadq. Por outro lado, certos conceitos sôbre as Academias não_ me fascinavam. Provocam elas, instintivamente, a idéia de obra concluída, de - estase do pensamento e das formas de ex– pressão. A vitalicied~de dos seus tít~los, a~nda que não agra: vada pela remunera_çao da presença mofens1va, o traço multis– secular das suas estruturas, o timbre distante dos seus pronun– ciamentos, um certo ar vetusto e ornamental que as cerca - 0 fardão, o colar, a poltrona - emprestam-lhes, quase em tôda parte, uma_~osição impopula~. Eu ~róprfo as devo ter segura– mente hostilizado e, quando JOvem, Jamais conseguira perceber, sob o aparato das suas reuniões, outro mérito além da ·triste eficácia de reunir alguns valores heterogêneos, não raro dis- - 278 -

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