Revista da Academia Paraense de Letras 1964
REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS pejos da mais bela fulguração poética, que impossivel seria ao indiferentismo interpôr-se entre aqueles dois sêres. E por isso ardentemente, se amaram. Rhossard possuia uma figura de "gentleman", de cabe– los e bigodes louros, olhos garços, forte compleição fisica, com uma grossa bengala de volta, e um jeito assim de olhar fito às multidões, talvez confiando no seu ideal poético, e na própria beleza. - Ou fôsse porque, disse eu, - os poetas quando olham a realidade têm sempre a mente na ilusão. - Talvez fôsse isso, concordou Frederico. O que é cer– to, segundo me lembro, é que a sua figura simpática, quem vis– se uma vez, não a esquecia mais. Porque apesar dos seus 28 anos era um sêr medidativo, e postava-se às esquinas com ami– gos, às vezes com ar distante, mas numa pôse invicta de Ado– nis. As relações amorosas entre o meu parente e a sua vizi– nha com o andar do tempo criou raizes profundas. Até que um dia teve que se chegar à prestação de con- tas. Rhossard era reincidente boêêmio. Na "A Província cio Pará", onde era redator, recebia no Redator-chefe, Senador An– tonio Lemos, a incumbência de escrever tal ou qual artigo, sôbre instituição ou reputação de político, e o artigo, magnífico, bri– lhante, saía dum jato, porque o seu autor possuía uma mente prodigiosa. Mas tinha com êle um percalço sério : mandava buscar na venda próxima uma garrafa de conhaque, que abria e punha ao lado, donde ia tomando cálice sôbre cálice. Rhossard era, na idade em que o homem começa a se formar, um farrista e alcoólatra inveterado. Todo aquêle álcool ingerido, e vida de lupanares deixa– vam os seus residuos transformados em poesias belíssimas, que enchiam de incontida admiração quantos as lêssem. Cassillda, a custa de medita~ões e a conselhos do pai, recuou em tempo. E disse-lhe : - Olha Frederico, não podemos mais continuar com este namôro porque és inco1Tigível. Naufragarás no vicio, e a mim matarás de dôr. Precisamos terminar. :Ir: o nosso futuro, que prevejo, cheio de escuridão. E romperam. Daí a mágoa profunda do poéta, mágoa que, como se sabe acabou com a morte. . ' 165 -
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