Revista da Academia Paraense de Letras 1964

REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS Na avenida, os ônibus passavam, num ruido surdo, que aos poucos se ia perdendo, ao longe, no silêncio. . . A quietude da deshoras substituia o bulício das ruas ... - Conheces pormenores ? - Naturalmente. Ela falou-me num aniversário em casa da Alda Melo, que foi onde primeiramente conheceram que se amavam. Depois, ela referiu-se a um dia de rega– tas, a bordo, e que desembarcaram às duas horas da tarde . . . Disse mais de uma medalha que oferecera ao seu amado, e a qual tinha a efígie da Virgem . . . Mas desculpa-me, amigo, se te impaciento - ; conto-te tudo isso para ajudar a tua cura . .. Raimundo estava espantado do que ouvia. - Mas olha que é já tarde ! - disse o outro. Levantou-se; e consultaido o relógio : - Onze horas, maroto ! Estou a morrer de sono ... Até amanhã ! ... E saiu. O amigo acompanhou-o até a saída do jardim. A rua estava calma, tranqüila. Fechou o portão e dispôs-se a recolher . Achava-se comovido, com as mãos geladas. Pela história de Carlos acabava de desvendar todo o mistério do passado, até então incompreensível. . . Sim, Sílvia era a pura, era a ideal, que de momento se convertei,a numa ex– traoddinária visão de amor. Porque, pelos pormenores con– tados, a entendia, enfim. Era êle próprio a pessoa que ela amava. E o idiota do Carlos sem o saber ! ! Por entre o arvoredo da chácara, olhou : a noite es– cura dominava calma, a vastidão de um céu escampo, em que aqui e ,ali as estrê,las coruscavam em cintilações diaman– tinas ... Lá fora, na calada das horas mortas, a cidade ador– mecia, com as suas praças desertas, iluminadas; os auto– móveis já raros, singrando pelas avenidas ensombradas; e as velhas casas nobres da Avenida de Nazaré imersas silencio– sas na penumbra ... •Raimundo, considerando que sua mãe tinha apenas urdido uma interesseira e maldosa intriga, tirava d'aí a origem dos fatos. Parou por momentos, e as– pirou com delícia o ar embalsamado das mangeuiras. E com a imaginação escandecida e povoada de esperanças, em que o amor renascia no seu coração com um grande alento, _ pensativo, entrou em casa, contempland? "in mente", uma grande felicidade esboçada em novos honz_antes ... - 115 -

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