Revista da Academia Paraense de Letras 1964
REFLOR-ESCIMENTO -.., MURILO MENEZES (Ocupante da Poltrona n. 13) Depois de ouvirem na sua tristeza evocativa, o sex– teto de cordas, de Brahms, tocado na eletrola, naquela sala a sós, ós dois conversavam - amigos íntimos e confidentes, - sôbre romanescas aventuras dispersas por êsses bailes fóra . . . A iluminação forte das lâmpadas reverberando sôbre as pinturas claras do aposento e pelo polimento fino dos móveis, fazia vivo contraste com a escuridão do exterior, em que a arborização se assemelhava a grandes sombras imóveis, suspensas por cima das ruas ... Segunda-feira, dia de repouso, em que se recupera o sono dessas noitadas perdidas . . . Raimundo, no seu pijama de sêda, com alamares, re– costado no fauteuil, rememorava a festa deliciosa e inolvi– dável, onde, porém, o seu coração sofrera um dêsses pesa– res, que só o tempo leva e dissolve no esquecimento... - Deves ter imaginado quanto eu sofri, Carlos, quando vi a Sílvia dançar quase tôdas com o Augusto. Mas como viste, fiquei na aparência quase que indiferente, inlpassível.. . Daí , que queres? Possuo um temperamen– to especial em que o amor próprio domina. Orgulho? Não sei . Dizer-te que o meu amor nasceu aos poucos, mesmo apesar da versatilidade daquela criatura, não acreditas ... Meu caro, uma verdadeira esfinge ! Ao princípio chegava– se meiga, com uns modos traindo tôdas as ternuras. . . De– p~is, era esquiva e arisca, com uns olhares que parecia des- • pedirem ódio . . . Sempre . desconfiado da sua sinceridade, f' durante o tempo em que me propuz candidato ao seu amor, falo-te com franqueza : nunca tive espe\·ança de ser real– mente amado. Então, às vêzes, sentia fortes desejos de - 113 -
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