Revista da Academia Paraense de Letras 1964

REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS retrato ofertado por seu neto, Orion Barreto da Rocha Klau– tau, tecia a dôce lembrança de sua ausência. Que o cronista, senhores acadêmicos, e não o orador, diga a esta Casa o quanto dói a ausência do Pai que hoje recebe · a vossa homenagem : "De Avertano, Meu Pai, trago a saudade. Também o calmo riso, o gesto amigo e o olhar de carinho que ofertava. Dêle herdei o amor pela beleza. Dêle guardei êste jeito meio lírico, de andar pelo mundo sem defesas. No mais êle foi úni– co, sem segundos. Hoje era seu dia, já sabeis. Os parentes, os amigos mais chegados, cêdo se aproximavam para abraçá-lo. Porque era seu dia feliz, traçava planos para as festas dos ami– gos. Sua casa era festiva nêste dia, e a todos Avertano abria as portas e o coração imenso que trazia. . Das memórias da infância que carrego, entre poucas ale– grias, trago essa. Na frugal mêsa do cotidiano se acrescenta– vam novos pratos, antigos vinhos, e os amigos brindavam amà– velmente, enquanto o menino triste amava de longe, o Pai dono da festa e da ternura. Homem feito depois, dei-lhe gravatas, vaidade não era dêle, mas amava os presentes mais simples que lhe davam. E as g1:avatas do filho, muito amou. Quando êle morreu, muitos falaram do professor, do amigo ou do escritor. Muitos disseram de suas várias virtu– des. Alguns recordaram raros defeitos. O filho que o amou por tôda a vida, nada mais disse aos demais, apenas triste, cho– rou amargamente a sua morte. Orgulhoso porém do seu pas– sado, sua memória cultivou em solidão. Seu carinho guardou, sua ternura, suas palavras mais puras ficaram intactas, no co– ração do filho que o amou. Quando ête calou a voz, conteve o gesto, o filho com– preendeu que havia partido. Nenhuma esperança de revê-lo, nunca mais sua presença, nunca mais. Primeiro o espanto, a incompreensão do visto e da verdade. O duro espanto dói, sabeis vós todos, a quem feriu a morte do sêr amado. O duro espanto dói, sabeis, repito, a quem partiu o ser que vos amou. Depois foi a saudade quase doce, e o desejo impossível de refa– zer, os momentos mais felizes, e tão vividos. Depois do duro espanto, esta saudade. Depois de sua partida - faz um ano, - sua presença constante, embora au– sente, seu calor, sua ternura, seu silencioso caminho acompa– nhando, o filho que o relembra em pobre canto". -99-

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