Revista da Academia Paraense de Letras 1962

REVISTA DA ACADEMIA PARAENSE DE LETRAS a que os modernos do seu tempo submetiam a língua. Queixa– se com uma veemência de que era incapaz, falando : "De fato, entra pelos olhos de um cego a forçada mendicância a que levaram o nosso donoso idioma e cousa que brada aos céus é estar o mesmo ,arrastando desconsoladamente uma pobreza que não vem da necessidade, mas da mórbida pr.eo– cupação do avarento que, apanhando ,migalhas e refugos, finge de carecente, quando a arca, lá dentro, até nas bordas se acha topetada de oiro e pedra fina do mais subido qui– late. Senão vMe ' se isso não é enfermidade, se isto não é miséria: tejoila de estrangeirismos, pechisbeques de neolo– gismos, arrebiques de pseudo-brasileirismos, em vestidura car– navalesca, mal encobrindo aos olhos experimentados a bro· toeja nauseante dos solecismos, corruptelas e plebeismos". o Mestre parecia ~angado ! E realmente estava de ânimo exaltado contra aquelas "migalhas e refugos" que apontou. Tanto é assim, · que, na sua çoluna dominical em "A Palavra", lança-se a zurzir os solecismos e os vícios de linguagem. "É sátiro e não satiro - escreve êle -. Não diga estalados, mas estrelados . Não pronuncie rúbrica . A palavra é paroxítona. Se devemos dizer ajuntar ? Claro que não. Er– rado. Deve dizer-se apanhar . Ajuntar, por levantar, é bra– sileirismo falso. Motorneiro, mas .como ? Na língua portu– guêsa· não há sufixo neiro, mas eiro . Motoreiro seria o cor– reto, por derivação própria, mas não é têrmo que agrade. Pois adotemos motorista, que é mais catita". Ontem, andava Carlos Nascimento às voltas com o fa– lar descuidado dos seus contemporâneos, zangando-se à toa com os galicismos, os neologismos e o abastardamento da lín- .·gua, que êle a queria pura e escorreita . Hoje, êsse "catita'\ que êle empregou na acepção de elegante, tornou-se sinônimo de gente inescrupulosa, sem palavra, em suma, "catita", é o mesmo que tratante . .. Imagine-se o pobre do meu patrono nesta Academia, nos dias que correm, o que não faria, se, tomando assento à mesa do almôço lá à minha casa, me ouvisse dialogar com o meu. primogênito, qµe frequenta o ginásio e tem uma dú– zia de anos : - "Pai, estou fumado ! - Está o que, menino ? - Fumado, Pai. Não morou? Pois quer dizer perdido ~mj~. ' - Bem, e por que diz você que está perdido ? - t: que o_s meu~ chapas,~ªº meu lado, começaram a fazer barulho e la s~ foi ia raça toda para a Secretaria. - l9 -

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