Revista da Academia Paraense de Letras 1961
Acadêmico JULI0 COLARES Sempre que leio e ouço esta sentença: - "Recordar é viver" - tenho a impressão de que seu conceito é incorreto, e não lhe encontro outro sentido senão como consôlo aos desalentados, aos inválidos, aos vencidos, àqueles, enfim, que vegetam à margem da Vida . Sim. Porque recordar, "no sentido restrito de evocar o passado em função da saudade", pode ser tudo. . . menos viver . . A saudade é um sentimento melancólico, debilitante, pungitivo e convida mais à contemplaçã,o e à inércia do que à vida, pois vida é mov·mento. Viver é agir, caminhar para a frente , acreditar no futuro, enquanto que a saudade não cogita senão do passado e da morte. Quem recorda em função da saudade, caminha para traz. E' a atitude dos velhos, dos velhos decadentes, que chegaram ao fim da jornada e já estão voltando da Vida. Ao contrário da esperança, "a saudade mata a gente". O que a esperança tem de dinâmica, tem a saudade de estáti– ca. E quem diz saudosismo, diz estagnação ou retrocesso. Só progride quem caminha ao encontro do seu destino - e a força que nos impele para a frente não se chama saudade: chama-se esperança, e é sob o influxo dos seus estimulas que se aceleram as energias da vida criadora. Vive quem confi a , quem crê, quem se agita: vivem os que acorçlam ao r ebate para a luta, vislumbrando na batalha do presente a vitória do porvir. Mas n ão vivem aque– les que só t êm compromissos com o passado, já sem objeti– vos, sem problemas e sem fôrça para esquecer o que não existe mais, "sempr e com os olhos volvidos para dentro, imo– bilizados na contemplação da sua paisagem morta". Esses, coitados !, até gostariam que os levasse a mor t e, aliviando-os do tormento de se encontrarem sós e não pode- - 133 -
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