Revista da Academia Paraense de Letras 1961

volúpia e da lascívia. Escreve então versos com a temperatu.::. ra dêste sonêto, intitulado "Danação": "Na salina da tarde que efervesce minh'alma freme, torturada, louca, num delírio de amor que em minha bôca toma um murmúrio hipócrita de prece! Prece, de carne, só se fôr. . . Espouca longínqua gargalhada que parece ser de um gnomo vergastando, rouca, esta febre brutal que em mim recresce . Febre de gôzo sopitado ... anseio de beijar, de morder moreno seio de uma mulher que se ofereça nua ... Tudo é lascívia! - verifico pasmo - O próprio mar que ao longe tumultua, ruge e rebrame em convulsões de espasmo". Aí está a revelação do grande desejo másculo tantas vêzes esmagado e reprimido: a sua angústia é mera inconfor– midade sexual. Esta linguagem quente, insinuante, provoca– dcra, e todavia desesperada, é a linguagem do mesmo poeta que conviveu com os anjos e com os santos. Feito para ser ci– ciado nos ouvidos da amante voluptuosa, como um dos mais belos mimos, uma embriàgadora galanteria, êste sonêto serviu apenas a uma posse imaginária. Não transpôs a solidão do poeta. E como em todo sorriso claro há sempre uma face obs– cura, êle chegou a ouvir uma longínqua gargalhada de um gnomo: censura impiedosa. De sua bôca ninguém a escutou. Provàvelmente jamais murmurou palavras mais quentes. E nenhum corpo se ofereceu às suas delirantes propostas de al!lor. No mesmo tom, imaginava cenas e bastidores, prostíbulos onde possuia imaginárias prostitutas, um qualquer "bagaço de mulher que já foi flôr! '' Fala, com ternura, com a meretriz; diz-lhe palavras bonitas. As terceira e quarta estrofes do poe– ma "Uma voz, um destino", contêm um diálogo entre essa f1rostituta ideal e o amante de uma n.oite, construido com pa– lavras de um formoso idílio: - "Eu te chamei! ... / (Psiu vem cá . . . ) Por que? Não sei, não sei! . .. / Por hábito talvez .. . Talvez por vício ... " E apesar de tudo, o pudor do adolescente a sentença, uma verdade muito pessoal: "O corpo da mulhe; - 120 - -

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