Revista da Academia Paraense de Letras 1961
O PóRTICO do livro inédito "Almas Tropicais" (cuja có– pia do original nos foi gentilmente cedida por Georgenor Franco) é um poema patético. A linguagem de Tavernard, na página de abertura e nos contos reunidos nesse volume, se ca– racteriza pela constante imgustiosa. Contém imagens deli– rantes, feéricas, empolgadas pela claridade tropical, a cuja luz do sol o homem é um monstro, era física , ora moralmente . A tragédia e o horror são os elementos de que mais se serve. A!cançam o paroxismo. Tavernard não era porém exclusiva– mente um tipo patológico em que o narcisismo predominasse. Suas emoções tinham diversas origens e êle afinal pôde conciliar as contradições de uma patologia trágica e um ins– tinto criador inquieto, que oscilava da suavidade beática, mís– tica, ao mais agudo sensualismo. O núcleo dessas emoções era o conflito permanente em que vivia, condição de estados ambivalentes . Apesar disso, soube ser extraordinàriamente sensível aos estímulos ambientais. A Amazônia traria segui– damente para a sua imaginação idéias poéticas, imagens lí– rii:!as, conceitos verídicos. Vale a pena acompanhar o poeta. Sentir, em sucessão, os seus pensamentos. Compreendê-lo, afi– nal, como homem, "semeador indeciso", por isso mesmo in– capaz de libertar-se. A maneira de Pi:ie e Dr.stoiewsky, e com a me~ma impetuo– sidade do nosso Álvares de Azevedo, Antônio Tavernard muita vez se aproxima do fantástico e naquele mesmo clima, pertur– bado e doentio, ambienta os seus personagens, levando-os ao desespêro, ao crime ou à loucura. à tragédia, ao horror , cujos palcos são os trópicos. Não logrou por certo, realizar integral– mente a sua obra, mas não há dúvida que deixou os seus versos pela vida . O EXILADO DO RANCHO FUNDO Incompreendido no seu tempo, hoje, no Pará, Antônio Tavernard é um poeta eminentemente popular. Merece esta popularidade, pois foi feliz o Toni das rodas boêmias e dos círculos intimas da família , o poeta dos proletários e das prostitutas, da miséria e da angústia, da resignação e do perdão. O poeta que melhor assimilou o folclore regional, o rítmo da melopéia cabocla, revestindo-o com uma poesia rica de sonoridade e sincopas de bom efeito. Místico e bárbaro. Filho natural do ·bôto e da yára, a vida tôda ouviu "batu– ques de pés pilando mandingas, / enquanto na água, por en– trP as aningas, / os bôt05 solertes espiam as cunhãs . .. " Foi feliz aquêle que mais chorou na Amazônia, feliz por– que foi poeta e soube dar à vida versos enquanto esta lhe ofertava "a doce mãe dos imortais - a dôr" . Sua poesia é amar ga, nunca porém desesperada. Recolhido desde os seus - 114 -
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