Revista da Academia Paraense de Letras 1961
mundiais - é possível que, nesta época, tenham perdido sen– tido e posição a palavra e o seu artista. Mas a culpa é menos dêstes que da época, esta nossa época paradoxal, diante da qual Tristão de Ataíde - num recente e admirável artigo - mdaga, em tom amargurado: "Será possível que o recurso à guerra, à violência brutal, à negação da razão e do amor, seja ainda, como há um milhão de anos, a única resposta que o homem civilizado encontra, tal e qual o homem das ca– vernas, par::i. resolver o probltma de sua coexistência na Terra?" Tem a palavra, no uso comum, um conteúdo lógico e, no uso artístico, um conteúclo poético - e ambos representam uma profunda interação do homem com o homem, naquilo ,;ue êle tem de mais autêntico, de mais êle mesmo: o seu es– pírito, o seu senso estético e emocional. Esvaziada a palavra de seus conteúdos, e cavam-se entre os homens abismos in– transponíveis e fendas irrecuperáveis, porque em nenhuma outra linguagem pode exprimir-se, com eficácia, para fa– zer-se compreender por si mesmo e por sua época, do que pela palavra humana, medida de fluência vital, reipositório do pen– samento eterno mas ao mesmo t:;mpo compromissada com os ambientes, as variações constantes do tempo e do lugar, tra– zendo dentro de si um processo latente de aproximação entre os sêres racionais, de solidarização comunitária - a pala– vra-linguagem e a palavra-arte. Estudando, c-om maravilhosa lucidez, o fenômeno literá– rio em sua interpretação com o tempo, afirma Guillermo de Torre, que devemos buscar a definição dêsse fenômeno, em primeiro lugar, "en el condicionamiento histórico de las mis– mas (obras literárias) , eu su temporalidad, en su situacion epocal, como fruto que son de experiencias y circunstancias insoslayables, tanto íntimas como extrinsecas. Pues ningún fenómeno literario y estético que defina una época se produ– ce ucrónicamente ni deja de registrar: huellas marcadas por vivencias rigurqsamente personales, referidas a circunstan– cias únicas" - (Guillermo de Torre. PROBLEMATICA DE LA LITERATURA. Ed. Losada, pág. 10). Se bem que possamos discordar dessa temporalidade, algo exagerada, que parece ressumbrar da conceituaçãb de Guil– lermo de Torre, não podemos negar que de fato , a palavra li– terária tem sido sempre o principal instrumento de dialoga– ção do homem com seu t empo. Não serão, por certo, o poeta e o literato os homens destinados a promover diretamente, com estudos especializados ou pesquisas exaustivas, o bem social das populações subdesenvolvidas. Seria, contudo, ino– minável cegueira ou inexplicável sectarismo negar à literatu– ra ou à poesia, um lugar destacado na problemática social - 96 - • • -
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