Quero - 1945

2 QUERO Dentre as recordações da minha vida avulta aureolada de imensa sau– daa~ a figura sempre tão doce de minha avó. Como se fôra hoje, vejo-a sentada num pequeno canapé do seu quarto a contar histórias aos neti nh o11. E de todas as que minha avózinha n os contou. uma se me gTavou indelevelmen te na memoria, uma pequena h istória sobre NOITE SANTA o nascimento de J esus. - "Naquela n oite, um pobre saiu a implora r auxilio, batendo de porta em porta: - "Socorrei-me bôas a lmas ! Em minha casa acaba de n ascer uma crian ca e eu preciso de um pouquinho de fogo para · aquecer minha esposa e o pequenino! Dai-me algumas brasas, pelo amôr de Deus!" Mas a noite ia alta. Todos dormiam e ninguem respondia ao apêlo do pobre homem. De repen te êl~ avistou ao longe um clarão e, caminha ndo pa ra la encontrou uma fogueira e, em volta d0la, um reba– nho de carneiros brancos dormindo, e um pastor a guar- da- los, tambem a o.ormir . Quando o hcmem que andava a procura de bra~as ch egou ao pé dos carneiros a bulha dos seus passos • acordou três canzarrões que estavam montando guarda. As largas bocas dos rafeiros abriram -se prontas para ladrar mas o som não saiu delas. o h omem amedrontado , nota - va que o pêlo dos cães estava eriçado e que as presas aguçadas luziam ~-º clarão da fogueira. Mas, com grande espan to para o pobre, os cães con– servavum-se inertes, sem ousar atacá-lo. Quiz, então , êle aproximar-se mais do fo~o para de lá tirar algu– mas brasas. Os car neiros eram ta ntcs e estavam deitados tão juntinhos, que n ão havia como pasa r entre êles. Foi mistér passar-lhes por cima para achegar-se à fogueira. E nenhum carneirinho acordou sob o pêso do ho– mem . .Quando o pobre chegou junto à fogueira o pastor que dormitava em sua enxerga de peles, ergueu-se impetuoso e irado. Era criatura ruim e mal enca rado. Ao vêr º· desconhecido agarrou, Jésto, uma enorme pedra e arremessou-a contr8: el_e. ü seixo. porém, pa rtiu diréto ao homem ; no momento em que 1a a tmg1 -lo, a pedra desviou -se e fo i espatifar-se no ch ão. O homem h umilde, chegou-se ao pastor e disse -lhe: - "Compade– ce-te de mim, ami~o. e deixa-me leva r-me algumas brasas para aquecer mi– nha mulher e meu filho ci_ue acaba de nascer". _ O prim_eiro impu_IsoA_do pastor foi o de uma _recusa cruel : _Pensou , porem, n os caes ::iue . o.ao ~mham ladrado nem mordido, nos cordeiros qne não tinham fu rrido e n a pedra que não quizéra ferir o homem . :E sent iu um mêdo indefinível. vago. - Leva o aue c, uizéres - re~nondeu secamente. Só havi~ no lume um mon te de brasas e o homem não "i:.inlla pá nem outro obJeto no qual PUC!esse leva-lo. O pastor, no fundo , regosij ava – se, certo que aquel~ h omem n ao podia levar aquele braseiro . Mas o hom~m humildemen te abru}(ou -se e afastando as brasas tomou- as em suas maos e as colocou i 1 .o manto. 'E os ca rvões jncandescentes n.ão )he queimaram :,,s mãos nem a tuutc::i, e ficaram a brilhar nelas como r ut.ilos rubis": Ne.:;te ponto inLerromJ:?i minh a avó, porque já não podia mais escu- t:i.r sem pedir-lhe esta exphcacã o : -V(?VÓ pc~qu7 as brasas -não queimaram o homem? , -Tu o saoeras ao seu t emoo _ replicou minha avo. E _continuou: - "~ uando ô pastor. que era um h omem ,::arrancu_do e máu vm essas cot~sas tao maravilhosas disse a si mesmo. - Mas que noite é esta em JUe oq c~<>s não mordem. os cordeiros n ão se 8.SSUS t arn, .a :Oedra não fe re e o fogo nao queima? Foi a o encalco do singular i.strange1ro e in- terrogou-o : - Continúa na pag . 12

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