Quero - 1944

20 QUERO A COMUNISTA -::onchaão partido ao lado da sarcastica criatura. De um lance estava em baixo e gargalhando afoitamente, rompeu a cotoveladas o grupo que se fo rmara ao pé da escada. Aproximou-se do padre. - "Reverendo, fale em latim; é a lingua que o demonio entende melhor" - disse em puro francês. O Irmão virou-se para responder-lhe na mesma lingua - e agora, com vóz já calma e serena, falou sLrnplesmente, pausadamente, triste– mente : - "Queria recomendar-lhe mais respeito nas palavras e no olhar, mais delicadeza e educação nos gestos, nas atitudes. Mas vejo que não me con1preendem ... " E retirou -se, olhos baixos, murmurando uma prece, que apesar da serenidade do semblante, se adivinhava ardente, angustiada, dolorosa. E lá se foi para o silencio, para a oração. Virgem Santa, rogai por nós . . . • --XX- - Mas, voltemos à nossa heroína e ao seu companheiro . Ouçamo-lhes o dialogo : - "Fiz uma bôa àquele padre, queria uma conversa fiada . .. São to- dos assim ... " Ela jogou fóra o cigarro. - "Mas a voce. ele respondeu melhor". - '·Cmo"? ... - "Então aquele "corvo" não lhe advertiu e aconselhou bons modos, educacão e respeito? Quero vê -los agora". Ele tornou-se ironico tambem; eram dignos um do outro. - "Para começar sendo delicado é preciso antes t ravarmos conhe– cimento. Percebo, aliás, que estou diante de uma personalidade rara" .. . - "Apresentacão em regra, para que?" - "Ora , - responde com liberdade o nosso libertino personagem - para gosarmos juntos êsses três fastidiosos dias que temos de passar a bordo". E sem mais preambulos : - "Pier re Fleury, francês, jornalista e literato. A senhorita viaja só?" - "Sim'' - responde com laconismo. - "E seu nome? Podia dizer ... Hesitou. Depois, quasi com arrebatamento : - '·Chamo-me "Ninel". Acha esquisito, não é? Inverta as letras, se faz favor". E o joven francês balbuciou, atrapalhado e confuso: - "Le ... nin". - E logo senhor de si: - "A senhorita é russa?" E ao ouvir a resposta afirmativa, assaltou-lhe a curiosidade para saber a origem de familia . _ "Nemara Dovna" - explicou ela - "mas isto não lhe interessa, não tem nenhuma significação. Aliás, revela apenas burguezia e mais quanta tolice .. . " Ninguem se dava conta do dialogo que se ~stava travando; os gru– pos, dispersos. aqui e ali, entretinham-se en:i amma?oras palestras, onde o gargalhar era a nota dominante, que enchia o navio. Isolados e esouecidos, continuaram : _ "Compreendo, agora . A senhorita é nada menos que uma repre- sentante da U . s . S . R ." _ "Sim - confirmou. - Mas isto não é o mais interessante - e acrescentou com cinismo - vou ajudar. Veja: estes olhos ... meu nariz .. . aqui está minha bôca . . . Compreende? - E o seu olhar fixava-se pro– Tocante nos olhos do francês, que responde, com dobrado cinii,mo: _ "Sim, senhora . . . que belo e raro especimen ! . . . E as suas pernas . . ."

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