Pará Ilustrado - 1943

n onoem on s-omonn ~~~~~~._,.,...,...,...,...,...,.,,,...,.,,,..,..,...,.._,...,.._,._.,_,,.,_,,.,._.,,,,...,...,...,...,.,,...,.,,...,.,,_,.,,_,.,~~~~~~~......, Lll.uru. oouh clu. u 1111i11lti ui.i o d m u. vbll . Afortunadamente o ospollO não regre■ ri senão no outro dia A noite, e a orlada pod - ria sair para dar um passeio com o menino. Muito .antes que batessem á porta, Laura já estava preparada para receber' a visita . . Puzéra no seu penteado toda a elegancia e arte de que era capaz. Queria por essa forma destacar o contraste existente entre. a descui– dada e misera rapariga de outro tempo e a _muUier de agora . A .mulher de agora, a po– bre mulher que abria a porta, trêmula, e·ce– dia a passagem ao visitante. Olhares de inveja caiam sobre o belo au– tomovel que 1 desc)a pela, larga avenida. Viam, porem, unicamente um carro brilhante, de metais reluzentes e delicadas pinturas. Pou– cos reparavam na mulher que o conduzia : u.ma mulher cujo chapéu e vestido eram da mesma côr do veiculo. Os que reparavam nela, não conseguiram, entretanto, notar-lhe o tremor dos lábios e a comi;>ungida expressão dos olhos. E não sus– peitavam que aquelas mãos brancas, segu- 1•as ao volante, precisavam. fazer um grande sforço para conduzir o carro em linha reta. Entretanto, a avenida era para aquela mu– lh r tão, familiar como sua própria casa. E Laura guiava o carro .sem ver os' pedes– tres que transitavam pela calçada nem olhar as outras carruagens que passavam a seu lado . Não via, não poderia ver nada : as lá– grimas que lhe enchiam os olhos esfumavam a paisagem numa névoa vitrea. Uma yez na esquina, virou' e tomou a: di– reção da " garage" próxima, onde introduziu ci deteve o seu " coupé" . Permaneceu um ins.. tante irresoluta; depois · desceu rapidamente do veiculo e encaminhou-se nervosa para,sua casa. Ao chegar á porta daquele apartamento do segundo andar, ouviu a voz da criada, que conversava com o filhinho no fundo da casa. Abriu, entrou no vestibulo e fechou logo a porta, como se temesse que alguem a seguisse. Penetrou no seu quarto. Um aposento es– paçoso, com quatro grandes janelas ·que da– vam para um pequeno jardim. 4 clara luz de uma tarde de verão iluminava-o. Aproximou-se das poltronas colocadas junto a uma das janelas e deixou-se cair pesada• mente sobre ela. Imovel, riglda como fan– ta~ma do desespero, apenas ·no tremor das· mll:os traduzia sua profunda excitação inte- 1·lor. Nesse momento, representava· a idade que tinha : trinta e cinco anos . Trinta e cinco anos que uma existência cheia de comodida– des e de satisfações fazia comumente parecer multo menos . Apesar disso, ,causava a im– pressão de ser uma mulher cuja infancia fôra dolorosa e triste, mas compensada pela ~entura de uma juventude serena e luminos11,. Sentada na beira da poltrona, com os co– tovelos apoiados nos joelhos e as mãos uni– das, meditava. De repente, tirou o chapéu lontR,mente, e deixou-o cair no chão. Seus olhos vagaram pelo aposento, detendo-se no leito e nos quadros das paredes. Depois, fa– zendo um esforço para não ceder á emoção que aqueles objetos familiares lhe produziam, reconstruiu o fato que provavelmente viria '•perturbar a felicidade completa que há cinco anos gosava . .... Era o dia de seu aniversário. Nessa manhã, logo após o primeiro almoço, o esposo a le– vára para buscar o belo "co1,1pé" que Laura desejára ardentemente desdé algum tempo. Era aquele o mais luxuoso ,presente que a esposa podia pretender. A' tarde, conduziu o marido á estação, no mesmo ca11.·o. No trajeto da volta, deteve-se para prover-se de . gazolina. Foi nessa ocasião que notou um sujeito Ins– talado junto ao volante de outro carro e que a olhava com um sorriso maligno. Era um homem cujo rosto aparecia demudado pelas marcas do vicio e côberto de rugas de Im– pressionante crueldade . Cinco anos fazia que Laura não via aquele homem ! Cinco anos vividos na esperança de não tornar a vê-lo nunca mais ·I Conhecia o rosto daquele homem como ele o seu próprio, desde o tempo em que era uma 1·aparlga desamparada, sem amigos nem pa- 1·entes que arrastava a vida num ambiente de crime. Quasl dois anos, durára essa vida, fe– chada para sempre por uma sentença ·judi– cial que a encerrou em um asilo de menores . -~ 1)utto.n, Coisa extre,ordinária: 'foi justamente no asilo.•que Laura compreendeu qual deveria ser ·a direção que lhe convinha dar á vida. Ela ·não era uma rapariga "má", na -acepção que costumamos dar a essa palavra. .Faltava-lhe simplesmente a exJ?eriência. Sem um prote– tor, sem uma mão amig_a que a guiasse pela 'senda do bem, caira no abismo daquela triste existência que durára dois anos . O asilo salvou-a. A dil'.etora· despertou na sua alma o sentimento da responsabilidade, dando.:Jhe pàra ler livros edificantes, apaixo– nando-a pelo estudo e depositando no seu cérebro gérmerµ; de nobres ambições . Quando saiu da sua reclusão, ·transportou-se ,para uma cidade longl.pqua, e começou a t!abalhar. Desempenhando-se no seu posto com .corre– ção ·e perseverança dignas de elogio prospe– rou até conseguir uma posição· que lhe per- Um inteligente -sonlso .brl11çou nos lábios de Felipe, quando Laura o conduziu através do vestibulo, convidando-o a pàssar para a sala . Os olhos do aventureiro examinavam os objetos e os móveis para ratificar suas pre-· sunções _a res~eito da invejavel posição de Laura. E assim. poude conclUir que naquela casa "havia multo dinheiro" . Se:çitaràm-se um em frente ao outro. Lattr3 convivêra com aquele homem apenas alguns .meses, -mas sem manter relações diretas com el,e. Entret11,nto, conhecia-o o suficiente para compreender que nada lhe mudára : era o mesmo aventureiro sem escrupulos de OU" tróra. Assim -o demonstravam seus olhos agressivos, zombeteiros e cruéis. Foi ele quem primeiro falou articulando com mallcia : , -:- V:eJo com prazer que você fez carreira, Laura : . mitlria afrontar com confiança o futuro. Co– nheceu o homem qtie deveria ser seu esposo. E com aquele homem forjou os seus sonhos de amor e criou esse lar Iluminado agora de Laura eS t eve para responder com um gesto ventura •pelo sorriso de um tilhlnho. · ·' de protesto, á insolente insinuação, mas con- ,Nos seus anos de vida conjugal, J>0Ucas ve- teve-se. Não devia -ofender . nem provocar · zes recordára a lnfància e aquele perlodo de -aquele hom~m, e sim ouvi-lo e saber quais as •inconclência. Não· queria pensar nisso, por:. suas. lntençoes. Não tardou em .sabê-lo. Fe- . . . . . · lipe André exigia-lhe a entrega de quinhen– tos dólares. Laura, dominando sua impa– ciência e nervosismo, replicou que não tlnha essa quantia.1:m casa, e que precisaria de al- . . [:J '[I [3[1 .[)~ [J] úJ ~ r3 [l ~ l!@□ITCDln[)~ I . que ainda sentia uma aguda pontada no peito ao evocar sua passada miséria. E frequente– mente perguntava a si própria, com angustia, se a ventura presente não seria um belissimo sonho que não tardaria a desvanecer-se á luz de uma dolorosa realidade . Pouco a pouco, o medo do passado lhe de– sapareceu por completo do espirito. A vinda do filhinho infundiu-lhe uma se– _ renidade absoluta .. . Mas, eis que. agora via erguer-se novamente diante de seus olhos, como um horrlvel maleficio, a odiosa figura de Felipe A!ldré. * • • Um estremecimento percorria-lhe. Q corpo ao pensar no olhar sarcástico que Felipe lhe dirigira ao vê-la junto ao depósito de gazo– lina. Laura tambem olhé.ra para aquele ho- · mem. · · Tinha medo. .Felipe lançára um olhar ao carro de Laura, calculando por essa forma a posição ecopômioa da sua dona. E ela, que o con'hecia desde aqueles seus anos de incon– ciência, sabia que ele era, um homem capaz . de tudo. Durante a longa tarde, Laura .atendeu a seus afazeres domésticos com uma nervosi- 1dade de quem espera algo quê fatalmente terá que suceder . A ridente vozinha do filho não era suficiente para lhe afugentar do co– ração o medo; pelo contrário, aumentava-o. E quando se preparava para jantar, suce– deu o que temia : soou o telefone. Atendeu ao chamado. Ao ouvir a ,roz fria daquele ho– mem, permaneceu como petrificada, incapaz de articular uma palavra. A mensagem de Felipe André foi curta. : iria visitá-la ás nove horas. P'ARv\' ILUSTRADO gum tempo para obtê-la. . - Bem. Dou-lhe vinte e quatro horas de prazo p'ara que mos entregue - concluiu Felipe. E levantou-se, avisando: . - Amanhã, ás seis horas, tomarei a libel'.– .dade de lhe telefonar para que não se ·esqueça de conseguir o dinheiro. Salvo se você prefe- rir outra coisa. · A "outra coisa" era inteirar o esposo de Lauro do ano que esta permanecêra encer– ·,rada no asilo de menores. '• ' . ' Quando fechou a porta atrás de Felipe, Laura voltou para a sala e deixou-se cair desconsolada numa cadeira. Ela não temia que o esposo soubesse a verdade. Entretanto, ·não o· desejava,, .pois Julio pertencia. a uma familia cujo nome, três vezes secular, jamais fôra objeto de acusação alguma. E Laura não podia lançar uma nódoa sobre esse nome, que lhe era mais querido que a própria vida. Mas havia ainda outra razão para silenciar o passado: o menino. Laura tremi11,, pen– sando o que o conhecimento e a divulgação da -verdade teriam significado na vida da– quela criança. Por ela, unicamente por ela, tinha que conservar fechados os lábios de Felipe. Como, porem, d conseguiria ? Laura compreendia que . esse pedido d~ quinhentos dólares era simplesmente o co– meço de uma longa extorsão, que duraria en– quanto aquele canalqa vivesse. E era preciso evitar a todo o custo que o aventureiro se me– tesse na sua vida e a perseguisse como um fantasma do passado. · ' E, naquela noite de insônia, Laura exami– .1}.0U todas as possibilidades . Não lhe seria dificll conseguir os quinhentos dólares, map isso não seria a solução do probelma. Por outro lado, o esposo, notando a falta do di– nheiro, trataria de averiguar o destino que Laura lhe déra, e a esta seria impossivel res– ponder ás suas perguntas sem confessa a vertl< J.de. Pela manhã, ainda não ·tomára resolução alguma . .Tinha o dia inteiro em frente·dela . .. Sua nervosidade, aumentada pela noite em claro, tornava-lhe insuportavel a perman n– cia em casa, naquela casa que agora lhe apa– recia como uma constrtlção sonhada qu nll.1> tardaria em desmoronar-se, esmagada P h1, realidade. (Continúa na pãrlna l 4)

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