Pará Ilustrado - 1943
Malaquias Osorlo -pôz-me ao corrente -dos fatos, da seguinte maneira.: Como você sabe, o .nosso comum a.migo Marlo Mendonça, além de ser um excelente camarada, -era um desses temperamentos im– pressiona.veis, cujas emoções semp:r,e ficam; e por isso, tão vivamente sentira. a rutura de amor com a formosa Tetraida., criatura adml– ravel pela bondade e mocidade feliz. Marlo Mendonça. tinha lá, as suas culpas, é verdade, - pecadllhos cometidos por todos os homens, sem ser volubilidade, no entanto, porque, ne– les, o ideal se conserva !maculado . Mas houve denúncia, ~ o ajuste de contas, chocante. E po~ Isso, que não tendo a razão para robuste– cer-lhe o brio, o seu sofrimento era maior, mais pungitivo e dolente ... Os primeiros dias que se sucederam ao a.– f astamento completo e para sempre, daquela que sinceramente amava, foram, disse-me, - de um estado mórbido, apatia, e Idéia fixa que não arredavam nem por Instantes, da sua grande ma.gua . A paixão empolgava-o paten– telando-lhe com nitldês a casa, a rua, a as imediações donde ela morava - aspectos que se havmm Identificado com os seus felizes dias passados .. . Os conhecidos comuns e morado– res do bairro, com quem deparava, produziam– lhe forte sensa.cão de saudades, como se vies– sem ,trazer notlcias, perguntar"qualquer cousa que se -referisse á sua ausencia, comunicar um recado, fazer um comentário, ou de leve, to– car no assunto. Mas -não. Cumprlm-enta.vam, sorriam, trocavam uma palavra banal, -e lam– se, sem fazer a mais llge!ra referencia ao fato · que o desolava . A fáse aguda do rompimen– to, continuou Malaquias, - passou-se assim : Uma preocupação permanente, afogáda em mutismo, passeios de bonde at é o fim da linha, prom:enades pelas ruas do comércio, e frequen– cla ass!dua a todos os pontos concor.rldos. To– das as fisionomias, entretanto, tinham para êle os mesmos traços; nada o Interessava. O mundo tornára-se inslpldo. Por esse tempo en– contrei-o numa missa das "dez", em Nazaré, um doml-ngo . .Ele então não mais deixou-me ._ Num passeio ao "SOUZA", enquanto divagava. os olhos pelo agreste arvoredo, que daquele ponto em dea.nte, já vai transformando os as– pectos da "urbs", fez-me seu confidente, num desafogo largo, como quem procura uma jus– tl'flca.çij.o e um lenltlvo a.migo. E arrematando a conversa, concluiu: E daí, o que mais me desgosta, é que el,a esquecesse as nossas 1 ela.– ções com assombrosa rapid-ez. A pr!nclp!o não compreendi; mas depois tire! a consequenc!a. que ela tinha sido eximia na falsidade . Reve– lou mesmo a alguem, que o motivo da briga tinha sido um "pretexto" . E se fossem int rigas, meu amigo, retruque!, ~~ - se fosse tudo ao contrário do que tu jul– gas ?• • . Ele pareceu h esitante . Ao cheg_a.rmos ao "Souza", fomo-nos ame– zendar no bar, que ainda eXistia. por essa, épo– ca. E pedimos- ás llbações de umas geladlssi– mas "Book-Ales", um pouco de eloquencla pa– ra decifrar o doloroso enlgna ... A floresta r.as– cla logo á nos.sa frente, escura, misteriosa co– mo se fosse uma catedral abandonada.. O azu– lão, esse pássaro canoro, próprio das matas amazon!cas, de quando em vez turtur!nava o seu canto saudoso e cheio dum bucolismo in– t eiramente primitivo e selvagem . E ali, tro– cando idéias que, não sei se aplacavam ou fa– ziam mais rev!v-er aquela lassidão dolorosa, em que se debatia o meu ámigo, estivemos até o ºmeio dia . Um bonde vindo da cidade fez a curva, para regressar. Mendonça perturbou-se . Eu firme! a atenção, e vi que Tetraida seguia no veiculo, cada vez mais encantadora.. Deslum– brante e pálida, só eu lhe divisei no rosto e nos olhos macerados, os vest!glos !ncon!un– dive!s da angustia. Sofria. Mar!o disfarçou a sua presença, empinando com sofreguidão o copo de cerveja. Eu observava. _O bonde vol– t,ou, e ela passou desdenhosa, com a indiferen– ça das deusas !nacess!veis ás influencias ter– renas. O meu comparsa perguntou: "Então, olhou-nos ?" Ora, sempre tive o costume de querer dar '(ima noticia má, para destrui-la depois, com uma bôa. Não por perversidade. Mas por vo– lup!á. . Entendo que é valorizar uma fellcidade, quando alguem a vê chegar de repente, supon– do-a distante. E nesse crédo respondi ao com– p anheiro : "Que aspeto ostentoso de . fel!c!da– de aparentava a tua amada ! Estava resplan– decente. Agora acredito que se julgue feliz; enf im livre, meu caro, para gozar outros amô– res !" Ele sorriu oom uma resignação amarga, num esgare que mais parecia uin ritus de ago– nia. Continue!, porém, na crueldade, murmu– rando comigo, que a certeza do amor que lhe consagrava. Tetralda, ·dada pqr mim, seria a re– compensa feliz daquela dôr . Passava m a.is um bonde em direção á ci– dade. -Vamos, disse ele. E tomamos o carro de assalto. Seguiam já poucas pessôas . O movimen– to do domingo se a.calmára para a hora do aimoço . A Praça Floriano Peixoto estava des– povoada; além, o largo de Nazaré, jazia deser– to. Nós segu!amos s!Íenciosos . O extremo sen– timentalismo ou romantismo que revestiam os a.mores do Mar!o Mendonça, antes de serem uma cousa excepcional, tinham de constituir naturalmente, as ca.racterist!cas de todos os amores . Enquanto existirem o homem e as suas subsequentes fazes de ilusão e de ideal no decorrer dà vida: tem que haver o roman– tismo. Mais que um fenomeno patologlco, ele é a pro!}r!a essenc!a da condição humana. Por isso, por mais que qu!zesse espicaçar– lhe o amor-próprio, dizendo-lhe por brincadei– ra, que a sua paixão tinha redundado num fracasso, na.da disse; e seguindo para a Cidade Velha onde mbra.va , deixei-o, esperando vexa.– do e confuso o bonde da "Serzedelo". E Malaquias Os-orio, dando remate ao ufi– nale" daquela sona.ta que cantava a historia de um !dil!o triste, terminou assim: - A verdade é que-. eu fiquei com um certo remorso. Mas os dias sucederam-se; outras aventuras, outros passeios, e não o tornei mais a vêr . Depois, passaram-se os a.nos. . . disper– sando •sêres, ceifando vidas, como um venda– val que québra. arbustos, ag!ta as folhas secas, e tange tudo numa nuvem de poeira ... E eu nunca mais ouvi falar no terno amigo, naque– le bom e generoso Ma.rio . .. (J. fw_fnefn {4_mai4 ' •• / SHERLOCK HOLMES CABRAL COSTA No pelourinho das horas rvoltas, sevicia– do pela !nclemenc!a das eventualidades, cres- • tado pela can!cula exaustiva do a.fan quotidia– no, o homem elege ás aras do coraçã-o a mulher: que se const ituiu a perola de seus afétos. E :pela dignidade, pela opulencia do faus– to dos sentimentos femininos, - gama fulgu– rante que marca o predom!nlo no belo sexo, - esteriot!pamos na alma, com letras doiro e de modo inescurec!vel, a excelsa. rainha dos nossos sonhos ,rosicleres . ,, Gosando do-!}riv!legio de escolha, o homem tem um ideal definido. Desviando as vistas desse ' idea.l, nada lhe deslumbra a retina. E com que meticuloso cuida-do é aceirado esse ideal. Colocando-o no crisol das pondera– ções, vai ao reverbero da conciencia para_pu– rificar-se na exubera.nela das cogitações e im– pregnar-se do olor suave da sublimação. Fazendo-se credora de merec!m~n t os, ela, a deidade por excelenc!a, em tempo algum, no cá:dinho da amizade, q_!stila-nos a !ndelevel saudade que _sem:pre perdura., r-escendendo in– finitament e aos quadrantes da nossa ex!sten– c!a . E jamais emurchece a flôr da recordação no vergel do coração do homem. Flori com o esplendor da louçania, plena de fraganc!a, venusta de matizes e acalentada com bland!c!a.s nos cálidos paramos do esp!– r!to . O homem jamais esquece .. . CASA VV. J-1 1T ;; . ... CUT8LílRIA DROGAS 08ílTARlíl8 P8RPUmARIA PlílA 1 ~ e niaie1iia1á fuVlíl deniidi4ã ~ áu PRO□uT·os D8ílTl=lRI08 "C8L88T8" Rua Santo Antonio n. 20 Telefone, 11 8 O BELEM • PARA' -8- . PARA' LUSTRADO 20-3-194-3
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