Pará Ilustrado - Agosto 1942 n.117

r • Ho nlern. na saJa d e leilura · do (asiio. enconlrei-rne frente ·a fren– le com Irene Eslefans , a esposa de meu primo S erg io. Fo lheava uma revisla ingleza e não rr,e viu entra r. Pude. i,ssim. examina r-lhe rn inuciosi,rnenle a fina silhueta , sempre agi! e elegante. mas per– cebi la mbem que s ua fronte esta– v~ s ulcada po r uma ruga que de– nunciava talvez a lguma profunda inquietação. A ca beça deslaca va– se-lhe sob re o a zul profundo do mar limitado no hori zenle po r uma a rdente franja de luz. A pa i– zagern lernpesluosa ron-:lozia com o espírito de minho arr.iga : em a mbos parecia inc ubar-se ume lra– gedia. Aproximei-me silenciosa. tomei– lhe a mão -no ins ta nte r.:m que a le•;anlava para voltar ·as paginas do revis ta . . Irene solto u um pequeno grilo de medo e em seguida levanto u-se pa ra a braça r– me com um sorriso de jubilosa surpresa. Falava . nervosamente. com pe– quenas interrupções, com r~ .~ s e vivazes gestos auloma licos. E eu compreendi q ue pc I l.raz da– quela alegria fo rçada pMp ',va a amargura de uma dor " "'onfes– savel. Não me falou do esposo. d e ,Sér,. como o chamava. Disse– me que se achava na Riviera ha– via uma semana. em companhia de seu filhin ho f ia v:o e d e urna inslilulriz a lemã. Eu apoiara os cotovelos na me– sinha, e, com o queixo entre as mãos, ouv ia-a. perscrulando-lhe o. rosto, · olhando-a nos olhos espkn– didos que fugiam pudicos ,ao en– contro dos meus. Quando se calou, conl inuei o lhando-a e estudando-a sem res– ponder palavra. abanando leve– y1enle a cabeça rom apiedada doçura Niio me fo, pos,;ivd diler– lht" uma frase que. sein rntlgua-la. pudesse t"xpres'iar-lhe meus lcmo– re'i. Ambas calan10-nos. Diante de nós. o mar, encrespado e <'nfure– cido. b11lia violento nos re<'iÍes da co5la De repenl<'. mordaz e or, r. lrt"• n<' p.-rgunlou-me :, - "lão me pede<; .110lin11s de lru primo? - Perdoa-me. mas sup111 que nii('l'ldest'jdl ~s folL1r dele- r rc"lpl'I• lal'l.'I leu $ilendo No enfonlo. e 1a que a im o queres. i'c11 ltt-lllC' F.scufo-li., com prazer ln•ne ~ordeu os l11hin,; t' tonli– nuou fotl.l'N',jo 6 rev1,;ta in~le7.6 enquanto eu conlemplal'tl o hori– Z<)llfe e a ofusurnlt• foixa dt> luz Pt·rmirnecefflos tls,;1111 nl!oluns ms– lunles. Depois, ln·ne µ01-;t' de pé 1 'J • 8 - 1942 [Q (!) ~ ~'3 (fl ~ 1 [1(~1]ff(D[3(!]@ O DUUIDO ~~ e convido u-me a l'lcomp1.1nha-la ao pa rq ue. C a minha mos por enlre os c aminhos deserlos. ladeados de a lias ar vores, e fomos nos refu– g inr num terraço solila rio. -Compreendesle. não é ve r– dad e? Compreendeste que fu jo de Sergio '? S im. Não sei se me g uia o odio . o ciesprt'zo o u o despeilo. Mas tolvcz seja uma d uvida. n1.1d a mais que unrn d uvida o que me o bri g!l u • exilar-me ~a ra medil1.1r. para dcscQbrir a verdade . . . D i– ze-me : linhas adi 1·inha rlo? -~im. querida. Ad ivinhei-o a n– tes que fa lasses. T eus o lhos. lua fro nll!. leu corpo. tudo traduzem essa inquietação que te d omina , -Ah. mas não podes imaginar corno é horrível esse tormento 1 Não saber. não poder saber ... Se Sergio le a tra içoa ? -Se me atraiçoa. e com q uem.. . Com qual delas. -Com qual delas? -Sim : Ct,m qual das duas. Conlar-le-ei. E' uma coisa exlra– ordiharia. terrivel. Um dos falos c.:om q ue o destino se compraz em perlurôar a paz dos espíritos mais serenos, em desfazer um lar. em semear odio e m11ldade Em alilude de abandono na nmplo cadt"ira de vime. levou a'I m<i< " ã cabeça como querendo t onler o tumulto de rtcordações. qu,. rnarlelnvam nela. - -No verão passado - prose– guiu, - fizemos relações com duas moças que acabaram sendo no'isas amigai;, e ás quaes talvez lu conhe– ças: Ana Ser!. esposa de um ban– queirn - formosa mulher, se as ♦ ••••• ♦ ... ♦ •••••••••••••• • • • ,,tJ,m,dia, ~idminetti : • • •••••••• ♦ •••••••••••••• ♦ PARA' ILUSTRADO ha , e exlrao rdina rillmenle esp1r1- lual - e Luc ia Frank . filhá do fa. rnoso coronel do mesmo nome. Nossas relações foram uma mu tua· e eslreila a misade enl re qual ro · pessoas. S e rgio formava parle do grupo. mas o mesmo não aconte– cia com o esposo d e A;ia,, pois suas ocupações não lhe perrniliam vis ita r-nos senão aos d omi ngos. Teu primo , como bem sabes; foi sempre o , enfanl ga,Lé, das moças. P ossue o dom de fala r ã s mulheres. de a trai-las com suas ma neiras entre cord iaes e iro ni cas. com seu ar entre lerno e zombe– teiro. N ing uern. a o con versar com e le, sabe se se encontra d iante de um homem secre tamente apaixona– do o u de um fo rçante. Se ja como for . S ergio encanta as · mulheres. P roduz-lhe a impressão de .um ar– tista empenhado em 1 ••11111r em seu jard im llo res da ma, tCi,·t"rsa pro– cedenc ia. que clepu,s esluda e compara com en! u~,11~mo de cole– c io nador. Ana e Lucia eram nmbas muito elegantes e soc.:1aveis. Ana. mais inteligente e audaz Lucia . senli– menlal e mimosa como uma gali– nha de luxo. Ambas ansiosas de di versões e a venturas. U niu-nos u rna arnisade exaltçid a. intensa. frat erna l dirin. se a pela– vra não pecas.,e. por pueril. Acha– ve1 mo-nos nos Alpe~. e a impo– nente solidão da nahtreza conlri– b uia para 'transformar nossos t'S• pi, ilos em a lgo assim como um d esejo inslmlivo de dl'frso contra B tris teza d os p icos ne,·Bdos. Não pra!icavamos. ndn deseja– var.,os prlllicar o ayimismo. O a ulomovrl de Ana oferh 1a-n0s 11 po~sibilidade de -sairmM em busrn dt avenl uras entre 11~ periqoso" caminhos das rno11lanhe1s. finol· menle, a iden!idode de no,;sas 111- clinações acabou por unir-nos ain– da mais. Ouando começaram os dias frios. descemos ã cidade. Mas nem poT isso diminuiu nossa arnisade. Ana e Lucia visitavam me assiduamente enqua nto Sergio chamado a aten– der seus negocios, apena~ com– partilhava conosco algumos noita– das. lnlervinha. no entanto em lo– do~ o<i 11ossos assuntos: aconse– lhava-nos a escolha dr tal ou qual modelo, acompanha Anila ao pia– no. e preparava para Luc1a o pc.o– jeto de uma vilo. que a filha do coronel desejava mandar construir entre as colinas. Ambas me leslt'munhavam um afeto sem limites: obsequia\'nm– me com flores e presentes del1ca– d1ssimos. acariciavam Fl11vio e mi– mav11m-no ao extremo d~ desfrui~ rcm meu'> esforços para dar uma boa educação ao meu filhinho. ' l " ◄ .. ~ •I ,r . '· ~ - t '

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