Ephemeris, v.1, n.1, agosto de 1916. 115 p.
94 EPHEM:ERIS dos philosophos nebulosos que affirmam a identidade do ser e do não ser, do justo e do injusto, do bem e do mal, fica por obra do co– mico, entre o estoque da tradição e a parede do dogma. Sem duvi• da, ultrapassaram os limites das deducções legitimas os que quize- • mar vêr cm Aristophancs o verdadeiro algoz de Socratcs e nas suas investidas o principio da lucta que levou á prisão e á morte o pae da philosophia grega. O proprio Platão, no "Banquet e", descreve as r elações amisto– sas dos dous genios tão profundamente diffcrentes, e o largo espaço de 23 annos que medeia entre a representação das "Nuvens" e o iníquo processo de Anytos prova que, se, contra toda a verosimi– lhança, um foi o corollario da outra, muito tarc1ou em germina · a ~<;e– mente de odio lançada pela comedia no espírito dos Athenienses. O verdadeiro alvo das settas ervadas elo Mestre é Cleonte, che– fe da demagogia, general amador, tribuno ruidoso, omnipotente e usurpador. A proposito de tudo e até fóra ele proposito, em cada peça que, Minerva alada, lhe surge do pensamento, o poeta criva de apodos, de cloestos, o seu espantalho, attribue-lhe todos os vícios, ne– gll-lhe as mais comesinhas qualidades, empresta-lhe os mais baixos sentímentos,descobre-lhe taras secretas, intenções interesseiras e cri– minosas, ridiculariza, na mesma pessôa nivelada com os peores alei– jões do mundo moral, o guerreiro, o administrador, o financeiro, ·o homem, o filho. D 'esta vez, Aristophanes ergue-se á altura do jor– Italista da opinião, independente e convicto, arrosta com as iras elo poder, e, soberbo, impavido, desafia o raio que brilha e se agita nas mãos de Jupiter. Ch,~ga um morr.c•nt0 cm que, incapaz de conter a indignação, fingida ou real, que lhe inspira o homem novo gnindndo á dictaclu– :ra, o satírico cospe-lhe' á face, nauseado e cl 'esta vez trag-ÍC'o, no meio dos cortezãos que acclamam o venecdor ele Sphacteria, Ha presença d 'este, a peça dos" CavaJleiros", onde o auctor, na falta de quem se atreva a tanto, representa o papel do tyranno. A coragem de },ristophanes honra o seu caracter, mas é. :,,o– bretudo, o seu est)rlo, comparavel ao dos melhores mestres da lín– gua grega, ora energico como o de Demosthenes 1 ora engraçado como o de Luciano, ora poetico e cantante como o de Píndaro e d(~ Si.monides, "jornalístico" como o do mais violento Tyrtêo parti– <l.ario, que lhe assegura a immortalidade. Nos seus menores escriptos o espírito esfuzia como um fogo de vista. E, se nem sempre mereciam a qualificação de atticos, os seus gracejos, salvo talvez por terem brotado elo mesmo sólo que a oliveira sagrada; se alguns são grosseiros e até immoraes, primam sempre pela espontaneidade que é um dos maiores encantos das "folhas volantes", na expressão de Luiz Venillos, e poucos exce– dem em ousadia erotica as narrações, traçadas por certas penrtas, das mais nojentas aberrações do instincto genesíaco!
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