Ephemeris, v.1, n.1, agosto de 1916. 115 p.
EPHEMERIS 93 Não deixa de espantar - é forçoso confessal-o - esta abun– dancia de pormenores em assumpto tão esteril, quando do celebre comico sabemos apenas a data do seu nascimento, as occasiões e o tempo em que fôram representadas certas peças, quando nos falta a maior parte das obras primas a que deu o ser, ignorando crassa– mente o log·a1 lLO seu berço, as pcripecias da sua viela, quando da sua morte e provavelmente a parte mais rica da sua bagagem litte– raria. 'l'alvez seja essa mesma inc:erteza em que tropeçam os que escrevem sobre Aristophanes o mot.ivo da superabundancia dos commentadores e criticos. A curiosidade humana teima em de– vassar os acontecimentos que mal lhe apparecem na penumbra dos tempos idos, e, na falta de dados historieos, dá largas aos devaneios da phantasia, ousada usurpadora dos direitos e das funcções de Clio. Ninguem nos levaria a mal hnçar-nos tambem, através do es– casso urelume ela cert eza, a trama iriada elas h~-pothescs. Preferi– mos glosar simplesment e o appelliclo de jornalista que encima es– tas linhas, accrescentaclo aos outros títulos ele gloria que exornam a cabet:a do genio, ou mesmo, para não incorrermos no desagrado dos guias ela opinião publica, encarregados ele indicar ao povo, em cada dia, a exemplo elo Senado romano convocado por facecioso t~Tanno, o môlho com que eleve regar o rodovalho politico, substituil-o pelo de pamphletario que, por vezes, se confunde com o outro. Nada escapa ás dentadas, ás unhadas de Aristo11hanes,na posse plena ele todos os privilegios da comedia antiga. Os philosophos, os poetas, os oraclorc~, os demagogos, os generaes, os financeiros, são chamados á barra elo seu tribunal, ouvem as mai~ ,lnms admoes– tações, os insultos mais crueis e tremem. Tal qual os nossos pnbli– cistas, pelo meri0S os mais apaixonados, trata todos 08 assnmptos políticos, litterarios, sociaes, philosophicos, rclig·iosos, com a mesma intransigente e atrabiliaria auctoriclacle, eructanclo sentenças, ejacu– lando condemnações, distribuindo castigos, impiedoso, tetrico, to– nitroante. Ai de quem, como Cleonte, o processou por occasião dos "Ba– bylonios" ! Ai de quem, como Enripcdes, desthroua o seu idolo Es– chylo, ferindo-lhe a delicadeza litteraria ! Ai ele quem, como Socra– tes, irrita-lhe, com o feitio do nariz, o amor elo bcllo, com o convivio plebeu, as preferencias aristocraticas, com o systema philosophico, o culto da antiguidade e da tradição ! Dos inimigos do poeta Euripecles foi ainda o menos maltrata– do. Além de alguns epigrammas,por sümal bastante ao-ndos o o-ran- d . ~ ,.., ' E, e trag·ico pouco soffreu do latego sempre levantado sobre os con– temporaneos. Soerates teve mais largo quinhão na distribuição dos ataque?;: accusado de impiedade ou antes ele atheismo, servindo aos seus dis– cipulos argumentos grotescos que Moliére requintou, avô caricato
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