A Semana: Revista Ilustrada - 1921, v4, n.152, fevereiro

· - -- - -- - OS - CONTOS . 1 ... ... * ... * -DA - } 11 SEMANA f -Vamos lá? - disse fr. Lou– renço. Elia respondeu-llu• numa língue estranha. O capu,·ho i11terrogou o erudito: -Que diabo diz ella, mestre? - E' hebraico, é hebraico l - respondeu o sabia. · Foram andando. Chegaram a um sitio divino. onde os bi– chos dormiam, ao luar que os azulejava esliraclos, numa prn– miscuidade amiga. Um paqui– derme babnva-se á lua, como em extase. O capucho pergun– tou: - Elles ferram, mestre? - Não, seu pedaço de asno, enrno que lbe tenho eu ensi– nado? E depois, afagando a juba. dum leão, que cabeceava, d9 grandes oculo!i de oiro: - Como vai isso? O leão a baixou a cabeça, e respondeu roufenho: - Esquisito do ligado. muito esquisito do ligado! ... Elle alé os conhecia !-pen– sou o capucho. Os tigres dormiam com as cahecas nos ventres das hie– nas. 0 Sobre o dorso dos ele– phantes bro~zeos estavam pou– sadas, dormmdo, grand es aves dum matiz iri sado. As onças, mosqueadas, d e vei em quan– do diziam adeus com a pala a a fr. Lourenço- e no homl~ro veio en..:a rra pilar-se-lhe, gu in– chando, um macaco esbelto, d e grande rabo azul. - Leve este para o con ven– to . .. - disse o ca pucho. - r?nn/o de Julio Brandão , -o sonho do Capucho ............... 1 (Conclusão) -Não diz sen:'io asneiras – volveu o outro, reprehensivo. Aqui não mora gente ? - in– quiriu o discipulo. Fr. Lourenço apontou-lhe algue111. O capucho ficou c.:0111 os olhos arregalados. Uma mulher admirnvel completa– mente nua, surgiu-lhe cténtre os grandes mirlos. Trazia o cabello esparso e de oiro-em que o luar pur:lrn pedras pre.! cios~s. azuladas como vagalu– mes . Elia sorriu-se.altiva como uma deusa, e comecou a ca– minhar por entre as ·féras ful– vas, conio rainha excelsa. Seu corpo lacteo, enluarada e for– te. parecia feito oe camelias brancas- e as comas envolvi– am-na de oiro fino, quando a brisa passavri. O capucho teve um fnndo suspiro. Depois foi llO ou~ido de fr. Lourenco: -E a outra:• a da caixa de rapé ?- -E' a mesma meu peclaço de asno-responqeu o mestre. O capucho tornou a suspi– rar. Ella então estendeu-se em Ire relvas, com a cabe-ca loira poisaria em flores. O luar, co– ado pelos ramos, tremia-lhe na carne vigorosa. Em ,·olta tudo eram arvores felizes, cheias de fructas sun,::nent:-is e roseas, que pendia:n como seios ch eios d e seiv:-i; outras brilhavam luz e ntes, fulvas como dobrões. E emquanlo o seu grande corpo nu se recli– nava, uma antílope beijava– va-lhe os peitos, e um rouxi– nol cantava-lhe 1111111 braco. - Vou-lhe falar!-disse Ô ca– pucho, ganhando animo. -Só fala hebraico, a língua antiga! -'Que espiga, mestre- con– cluiu o outro. -Estude !-retrucou fr. Lou– renço E tossiu majestalico. Sentaram-se em duas pedras musgosas . A noite enchia-lhe o peito, ao capucho, de doçu- • rase de volupias. Um sicómo• ro estendeu um ramo, e poz-se a acenar por fr. LourP.nço . -Olhe aquelle a chamai-o, mestre! • - Que espere, ainda agora me sentei. - Diga-me uma coisa: eu não posso ir até acolá, ao pé de lia? - arriscou o capucho. O outro fitou -o longament~: -Veja de longe. Nada de ~proximações. Ia estragar tudo! -Mas olhe como ella se ri, mestre . - Faz ella muito bem ... Foi para ver que eu o trnuxe aqui -para ver! Acostnmc os seus olhos a serem sabias, a terem philosopbia ! - Olhe ella a atirar-me um beijo, deixe-me lá ir, mestre. -Não seja asno. A natureza é inconsciente; o senhor é um moinante. Deixe-se estar. - O' sabio fr. Lourenço, olhe que lindas borboletas a esvoa– car-lhe... -Estão no seu direito; que lhes preste ! - Olhe aquella grande flor, como lhe cobre o colo de pó– lem 1... O capucho calou-se.Os ollios beijava111 o corpo branco da deusa, que abria os bracos na relva fofa e luze·nte. Elie sen– tia -se mergulhar num mar de perfumes ardentes. O mestre, GRAN~ FABRICA s. VICENT~ ~:,::d~:o::~1~~~:,:.~.~ TeJcJ)l.lone, 134-7 95 , UUA PAES DE CARVALHO 59. Telepbone, 134-7

RkJQdWJsaXNoZXIy MjU4NjU0