O Ensino Revista mensal de pedagogia, literatura, artes e officios 1918-1919. Jun-Dez

• O F,NSI O 77 Por que motivo uma palavra , ás vezes inopinadamente, cede o lo– gar a outra '? Multiplas cirnumstancias concor– rem para esses effeitos: assim nem sempre é facil responder . Os mestres não nos elucidam ca– balmente o assumpto . Prende-se a este facto linguístico uma conside– ração de orde-m psychologica , com– prehendida de modo vário, e de vá– rio modo explicada. Os antigos grammaticos julga– vam ']Ue o desenvolvimento de uma Jingua se fazia de modo constante por evoluções progressivas . Alguns autores modernos delles se aproxi– mam quando opinam que as que– das e substituições vocabulares, por translações e modifi'cações de sen– tido, se explicam pela lei da util?:– dade, pois, segundo elles. o homem tem a propensão de lançar mão de fórmas meliorativas, que exp rimam de modo adequado os seus pensa– mentos, cada vez complicados e subtís. A' primeira vistn, assim parece. Mas, se attentarmos com o neces– sario cuidado nos factos da ling ua– "em, logo percebemos o q ue de pre– cario ence rra essa famosa lei, que, afinal de contas, quasi nada explica . Que « uti~idade » houve , por ex– emplo, no refogo da palavra !tomem, empregada no sentido indetermi– na_do de ~e, qua_ndo nas iinguas ir– mas subs1ste ate hoje com esta ac– cepção? Que vantagem aclYeio para a lín– g ua do_ esquecimento el e palavras expressivas como-despo1·to, redin– gote, garção lzospeda1·ia , sobre– carta e tantas outras, e consequente adopção dos pereg rinismo,;: sport , -croisé , garçon . hotel, cn vo loppe. etc.'? Pois não era convinhavcl á com– prehensão . clegancia e clareza da frase a d istin ·ção que se fazia en- tre as preposições per e por'? ( 4) Não exprime muito melhor a fór-– ma verbal- desvestir-a idéa que hoj e geralmente se representa pelo vocabulo -despir? E bem _assim aprisoar, a idéa designada por– prender? Lucrou a ling ua, porventura. com a proscripção de fórmas voca– bulares, de um r elevo de significa- .ção flagrante , w:imo, por exemplo, o verbo niaisque1·er, o superlativo presentissimo e os typos nominaes --beliz , m·tetica e caudaloso, este no sentido jus to de rieo , abundoso, abas tad o '? ( 5) E ganhou em energia com a pro– curada omissão da preposição de an– tes das denominações de ruas, pra– ·ças, estabelecimentos, etc.: rua Bra– gança , praça Republica, hotel Ave– nida- o que jámais fôra praticado pe – los ve lhos conhecedor es da língua'? Decerto n ão houv e, em nenhum destes casos, o intuito da utilidad e. Então que razão houve a pre– s idir a estas preferencia s ? Qual a explicação desses phenomenos psy– cholog icos mai s consent.anea com os factos da ling uagem ? E ' ao que de seguid a procurarei responder, em poucas palavras, dan– do, sine ira ac studio, a minha leal e sincera opinião, num a sumpto que precisa meditado. (4) No Prologo da ~-• ertição ci o "Hyssopo", do A. Cruz e Silva ( 1821) ainda ~e fazia po1· susten– tar essa differença . Tal opinião se npoia va no juízo le Duarte Nunes do Leão, de J eronymo Barbosa e ,Jerouymo Osorio. Este ultimo, numa só !case, põe á mostra a differença: e e viu o Reino que as pessôos per que se govem ava El-rei, eram da companhia do sna cevádeira e feitos ver ella, e por ella, e para a l– ia ser tudo ~m tudo • · Po,· designava sempre espaço, Jogar, real ou virtual, onde alguma cousa se move: passar 71ola rua; ir 710!0.~ mores ; passar po,· alegrias ... .Servia para in– dica r tambcm muitas outras modalidad es, entre as quacs as de causa , motivo, estimação. Tortavia, essa noção compre hensiva e ra restringidn; no que dizin respeito á noção do espaço, fu zio-se distincciio entre essa preposição e a pre posição 71e1·. Po 1· indicava sem– pre n cnusa. e per o espaço s imilitudinorio. AsRim, dizia-se: 71oln amor de Deus, e-as lag l'imas corriam pelo 1·osto. E' a lição de Moraes. (6 ) • . .. chuma sua casa o alfaiate mais cauda– loso . .. Arte de f urtar, pag. 143 ( ed. J. Ribeiro). Carlos Nascimento

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