MARANHÃO, Haroldo. Flauta de bambu. Rio de Janeiro: MOBRAL, 1982. 64 p.

PRUDÊNCIO LOPES: O FIMDE SUA HISTORIA A quem se detiver neste capítulo, sem haver lido o precedente, devo escla– recer que Prudêncio Lopes desde menino mostrou-se passional amante dos livros. Aconteceu que um dia interrompeu momentaneamente a leitura de um volume para aventurar-se no mar de águas negríssimas do matrimônio, mas logo retomando o fio das suas leituras. A bibliolatria não impediu que se fizesse rico e marido até obsequioso. Em outras e desnecessáriaas pala– vras é o que ficou escrito no passado capítulo, em cujo arremate houve menção a inexplicado urubu. Estranho parecerá que a um indivíduo tal ocorresse emigrar de ares. Mas ocorreu-lhe emigrar de ares, e foi a expressão livresca que usou ao consul– tar a mulher. O exato ,motivo desconheço, mas presumo que se prendesse a matérias financeiras; a mudança lhe ensejaria duplicar, triplicar talvez o patrimônio. Prudêncio Lopes abraçou calorosamente a oportunidade da viagem e cuidou de providenciá-la sem tardança. Viajou com a mulher e os filhos e instalou-os no novo domicílio, regressando para liquidar, a martelo de leilão, o recheio da casa velha. A liquidação do acervo seria obra de breves dias, e enquanto comandava as providências aposentou-se num hotel. Dois acontecimentos vieram a suceder: primeiro, tardou mais do que supôs a venda das suas alfaias; e segundo, defrontou-se ao acaso de um quebrar de rua com antigo camarada. O reencontro, saudaram ambos com alegria e nessa noite mesmo jantaram juntos. Já estavam no cafezinho quando o diabo sugeriu meigamente ao ouvido do camarada umas voltas por aí. Foi a expressão, aliás, que este empregou : - O Prudêncio, bem que poderíamos dar umas voltas por aí. Lopes não entrou na hermenêutica do convite, senão quando o outro lhe 49

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